Classe |
Apelação Cível |
Tipo Julgamento |
Mérito |
Assunto(s) |
IPVA - Imposto Sobre Propriedade de Veículos Automotores, Impostos, DIREITO TRIBUTÁRIO |
Competência |
TURMAS DAS CAMARAS CIVEIS |
Relator |
MARCIO BARCELOS COSTA |
Data Autuação |
19/05/2025 |
Data Julgamento |
11/06/2025 |
EMENTA: DIREITO CIVIL E TRIBUTÁRIO. APELAÇÃO CÍVEL. RENÚNCIA DA PROPRIEDADE DE VEÍCULO AUTOMOTOR. PERDA DA PROPRIEDADE. ART. 1.275, II, DO CÓDIGO CIVIL. RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA E ADMINISTRATIVA LIMITADA À DATA DA COMUNICAÇÃO DA RENÚNCIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.
I. CASO EM EXAME
1. Apelação cível interposta contra sentença que acolheu parcialmente o pedido, reconhecendo a renúncia à propriedade do bem e declarando a nulidade dos débitos incidentes posteriormente à manifestação de vontade, realizada em 02/08/2024, com condenação do Estado ao pagamento de custas e honorários advocatícios. O Estado sustenta a legitimidade da cobrança de tributos enquanto não formalizada a comunicação da alienação ao DETRAN/TO e impugna a possibilidade de renúncia à propriedade de bem móvel, bem como a condenação nas verbas sucumbenciais.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2. Há três questões em discussão: (i) definir se é juridicamente válida a renúncia à propriedade de veículo automotor como causa autônoma de perda da propriedade, nos termos do art. 1.275, II, do Código Civil; (ii) estabelecer a partir de qual momento cessam as responsabilidades tributária e administrativa do ex-proprietário do veículo; e (iii) verificar a correção da condenação do Estado do Tocantins ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. A renúncia à propriedade constitui causa autônoma de perda do domínio sobre o bem, prevista no art. 1.275, II, do Código Civil, aplicável também aos bens móveis, como o veículo automotor, independentemente de tradição ou de demonstração de alienação a terceiros, bastando a manifestação expressa de vontade do proprietário.
4. Entretanto, os efeitos da renúncia sobre as obrigações tributárias e administrativas vinculadas ao bem devem observar o disposto no art. 134 do Código de Trânsito Brasileiro, que impõe ao proprietário o dever de comunicar a alienação ao órgão executivo de trânsito, sendo responsável solidário pelos débitos incidentes até o momento em que o Estado toma conhecimento da cessação da relação de propriedade.
5. No caso concreto, o autor não comprovou a comunicação de alienação ao DETRAN/TO. Contudo, a ciência do Estado acerca da renúncia ocorreu com a contestação apresentada em 28/10/2024, marco temporal a partir do qual o ex-proprietário não mais responde por débitos de natureza tributária ou administrativa relacionados ao veículo, conforme entendimento consolidado no Superior Tribunal de Justiça e nesta Corte.
6. A condenação do Estado do Tocantins ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios deve ser afastada, considerando-se o princípio da causalidade, porquanto não se pode atribuir ao ente público a responsabilidade pela não formalização da comunicação de alienação pelo particular. Assim, os encargos sucumbenciais devem ser integralmente suportados pela parte autora, fixando-se os honorários advocatícios em R$ 1.500,00, com suspensão de exigibilidade, nos termos do art. 98, § 3º, do Código de Processo Civil.
7. De ofício, corrige-se o termo inicial da inexigibilidade de débitos, que passa a ser a data de 28/10/2024, momento em que se aperfeiçoou a comunicação ao Estado da perda da propriedade, devendo ser desconstituídas eventuais inscrições em dívida ativa ou cobranças posteriores a esse marco.
IV. DISPOSITIVO E TESE
8. Recurso conhecido e parcialmente provido.
Tese de julgamento: "1. A renúncia expressa à propriedade de veículo automotor, nos termos do art. 1.275, II, do Código Civil, constitui causa autônoma e válida de perda do domínio, independentemente de tradição ou comprovação de alienação a terceiros, bastando a manifestação inequívoca de vontade do proprietário. 2. As responsabilidades tributária e administrativa do ex-proprietário em relação ao veículo subsistem até o momento em que o Estado ou o órgão de trânsito competente toma conhecimento da cessação da relação jurídica de propriedade, marco que, na ausência de comunicação formal, pode coincidir com a contestação apresentada em juízo. 3. A responsabilidade pelas custas processuais e honorários advocatícios deve ser atribuída à parte que deu causa à propositura da demanda, afastando-se a condenação da Fazenda Pública quando a inércia do ex-proprietário em comunicar a alienação ensejou a persistência de débitos em seu nome, impondo-se, neste caso, a fixação de honorários advocatícios em favor do Estado, com a suspensão de sua exigibilidade nos termos legais."
Dispositivos relevantes citados: CF, art. 98, § 3º; Código Civil, art. 1.275, II; CPC, art. 85, § 11; CTB, art. 134.Jurisprudência relevante citada: STJ, REsp nº 1.775.668/SP, Rel. Min. Herman Benjamin, Segunda Turma, j. 06.12.2018; STJ, AgInt no REsp nº 1.777.596/SP, Rel. Min. Francisco Falcão, Segunda Turma, j. 05.12.2019; TJTO, Apelação Cível nº 0002104-75.2022.8.27.2714, Rel. Des. Pedro Nelson de Miranda Coutinho, j. 30.08.2023.1
(TJTO , Apelação Cível, 0003514-15.2024.8.27.2710, Rel. MARCIO BARCELOS COSTA , julgado em 11/06/2025, juntado aos autos em 12/06/2025 16:39:07)