Classe |
Revisão Criminal |
Tipo Julgamento |
Mérito |
Assunto(s) |
Estupro de vulnerável, Crimes contra a Dignidade Sexual, DIREITO PENAL, Crime / Contravenção contra Criança / Adolescente, DIREITO PENAL |
Competência |
TRIBUNAL PLENO |
Relator |
ANGELA MARIA RIBEIRO PRUDENTE |
Data Autuação |
25/04/2025 |
Data Julgamento |
04/09/2025 |
EMENTA: DIREITO PENAL E PROCESSUAL PENAL. REVISÃO CRIMINAL. CRIME DE ESTUPRO DE VULNERÁVEL. ALEGAÇÃO DE PROVA NOVA CONSISTENTE EM LAUDO MÉDICO PARTICULAR UNILATERAL. AUSÊNCIA DE CONTRADITÓRIO. INVIABILIDADE. HISTÓRICOS ESCOLARES DA VÍTIMA. DOCUMENTOS CONHECIDOS E DISPONÍVEIS AO TEMPO DA INSTRUÇÃO. INEXISTÊNCIA DE NOVA PROVA NOS TERMOS DO ART. 621, III, DO CÓDIGO DE PROCESSO PENAL. CAUSA DE AUMENTO DO ART. 226, II, DO CÓDIGO PENAL. ALEGAÇÃO DE DECISÃO CONTRÁRIA À EVIDÊNCIA DOS AUTOS. NÃO CONFIGURAÇÃO. DOSIMETRIA DA PENA. VALORAÇÃO NEGATIVA DA CIRCUNSTÂNCIA JUDICIAL CONDUTA SOCIAL. FUNDAMENTAÇÃO INIDÔNEA. DECOTE NECESSÁRIO. REDIMENSIONAMENTO DA PENA. REVISÃO CRIMINAL PARCIALMENTE CONHECIDA E, NESTA EXTENSÃO, PARCIALMENTE PROCEDENTE.
I. CASO EM EXAME
1. Revisão Criminal proposta com fundamento no artigo 621, inciso III, do Código de Processo Penal, objetivando a desconstituição de sentença penal condenatória transitada em julgado, que impôs ao revisionando a pena de 17 anos e 3 meses de reclusão, em regime inicial fechado, pela prática do crime de estupro de vulnerável (art. 217-A, caput, do Código Penal), majorado pelo art. 226, inciso II, do mesmo diploma legal, com aplicação da Lei nº 8.072/1990 (Lei dos Crimes Hediondos). A condenação baseou-se em atos libidinosos cometidos contra criança menor de 14 anos, com início dos abusos quando a vítima contava 5 anos de idade, praticados de forma reiterada e clandestina pelo então companheiro da avó da criança. O pedido revisional alega existência de prova nova - laudo médico produzido após o trânsito em julgado - que apontaria ausência de vestígios físicos e inconsistência nos relatos. Postula-se, ainda, revisão da majorante do art. 226, II, do Código Penal e rediscussão da dosimetria da pena-base.
II. QUESTÃO EM DISCUSSÃO
2. Há três questões em discussão: (i) verificar se a prova apresentada constitui prova nova apta a autorizar o conhecimento da revisão criminal, nos termos do art. 621, III, do Código de Processo Penal; (ii) determinar se é possível a rediscussão da aplicação da causa de aumento prevista no art. 226, inciso II, do Código Penal; (iii) examinar se a revisão da dosimetria da pena é viável na via excepcional da revisão criminal.
III. RAZÕES DE DECIDIR
3. A Revisão Criminal possui caráter excepcional e não se presta ao reexame de provas já apreciadas pelas instâncias ordinárias, devendo restringir-se às hipóteses taxativas do art. 621 do Código de Processo Penal.
4. A denominada prova nova apresentada - laudo médico particular elaborado após o trânsito em julgado - não possui os requisitos legais para ser considerada como tal, pois foi produzida unilateralmente pela defesa, sem contraditório, e com base em documentos já constantes dos autos. Ademais, o documento apresentado limita-se a reinterpretar elementos já conhecidos e analisados, especialmente laudos oficiais e depoimentos colhidos durante a instrução, não trazendo qualquer fato novo ou circunstância desconhecida à época da condenação.
5. Também os documentos apresentados para comprovar incompatibilidade temporal e geográfica -- históricos escolares da vítima -- não são considerados novos, pois estavam disponíveis à defesa desde a instrução criminal, tendo inclusive sido utilizados em suas peças processuais.
6. Conforme entendimento consolidado do Superior Tribunal de Justiça, laudos unilaterais sem justificação criminal não configuram prova nova para os fins do art. 621, III, do Código de Processo Penal.
7. O pedido revisional quanto à inexistência de convivência entre o requerente e a vítima deve ser conhecido com base no art. 621, inciso I, do Código de Processo Penal, mas rejeitado no mérito, diante da robustez do conjunto probatório que demonstra a coabitação e a ocorrência dos fatos. Os depoimentos da vítima e testemunhas foram coerentes e convergentes, e os relatórios técnicos realizados por profissionais da educação, psicologia e assistência social reforçam a credibilidade das alegações.
8. A causa de aumento do artigo 226, inciso II, do Código Penal foi corretamente aplicada, diante da comprovada convivência entre o revisionando e a vítima, circunstância que facilitou a prática dos abusos.
9. Quanto à pena-base aplicada, a valoração negativa da conduta social, fundada exclusivamente na condição do réu estar foragido, não é idônea para justificar exasperação da pena-base, razão pela qual deve ser decotada com consequente redimensionamento da pena.
10. Permanecem válidas, contudo, as demais circunstâncias judiciais negativadas - culpabilidade, circunstâncias e consequências do crime -, porquanto devidamente fundamentadas em elementos concretos dos autos.
IV. DISPOSITIVO E TESE
11. Revisão criminal parcialmente conhecida e, nessa extensão, julgada parcialmente procedente, apenas para reduzir a pena-base em razão da exclusão da valoração negativa da conduta social do réu, fixando-se a nova reprimenda definitiva em 15 anos, 9 meses de reclusão, em regime inicial fechado, mantida a condenação nos demais pontos.
Teses de julgamento:
1. Prova nova, para fins do artigo 621, III, do Código de Processo Penal, deve ser substancialmente inédita, inequívoca e produzida sob contraditório, não se enquadrando como tal laudos particulares elaborados unilateralmente após o trânsito em julgado.
2. Não configura decisão contrária à evidência dos autos a condenação amparada em conjunto probatório robusto e coerente, especialmente nos delitos contra a dignidade sexual, em que a palavra da vítima assume valor probatório diferenciado.
3. Na dosimetria da pena, a conduta social do agente deve ser avaliada em seu meio comunitário e familiar, não se prestando a justificar aumento da pena-base a mera condição de foragido.
Dispositivos relevantes citados: Código Penal, artigos 59, 68, 217-A e 226, II; Código de Processo Penal, artigos 621, incisos I e III, e 387; Constituição Federal, artigo 5º, XLVI; Lei nº 8.072/1990; Estatuto da Criança e do Adolescente, artigo 6º.Jurisprudência relevante citada no voto: STJ, AgRg no AREsp nº 2.526.544/MG, Rel. Min. Reynaldo Soares da Fonseca, Quinta Turma, j. 23/04/2024; STJ, AgRg no HC nº 717.980/PE, Rel. Min. Jesuíno Rissato, Quinta Turma, j. 25/10/2022; TJ-MS, Revisão Criminal nº 1405112-52.2023.8.12.0000, Rel. Des. Fernando Paes de Campos, j. 15/08/2024; TJSC, Revisão Criminal nº 5074117-91.2024.8.24.0000, Rel. Des. Carlos Alberto Civinski, j. 26/02/2025; TJ-RS, EI nº 70083383182, Rel. Des. Glaucia Dipp Dreher, j. 26/06/2020; STJ, AgRg no AREsp nº 1.531.519/PE, Rel. Min. Laurita Vaz, Sexta Turma, j. 18/02/2020.
Ementa redigida de conformidade com a Recomendação CNJ 154/2024, com apoio de IA, e programada para não fazer buscas na internet.1
(TJTO , Revisão Criminal, 0006685-73.2025.8.27.2700, Rel. ANGELA MARIA RIBEIRO PRUDENTE , julgado em 04/09/2025, juntado aos autos em 09/09/2025 21:27:59)