Documento:528245
Poder Judiciário
JUSTIÇA ESTADUAL
Tribunal de Justiça do Estado do Tocantins
GAB. DA DESA. ANGELA PRUDENTE

Apelação Cível Nº 0001495-05.2021.8.27.2722/TO

RELATORA: Desembargadora ANGELA MARIA RIBEIRO PRUDENTE

APELANTE: ROGÉRIO TAVARES RODRIGUES DA COSTA (AUTOR)

ADVOGADO: JOSSERRAND MASSIMO VOLPON (OAB TO05393A)

APELADO: BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A. (RÉU)

ADVOGADO: CARLA PASSOS MELHADO COCHI (OAB SP187329)

VOTO

EMENTA: APELAÇÃO. REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO E CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO. GRATUIDADE DE JUSTIÇA. AUSÊNCIA DE REVOGAÇÃO EXPRESSA. MANTIDA. JUROS REMUNERATÓRIOS. ABUSIVIDADE NÃO CONSTATADA. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. PREVISÃO EM CONTRATO. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. AUSÊNCIA DE PREVISÃO CONTRATUAL E COBRANÇA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

1. O Superior Tribunal de Justiça entende que, “uma vez concedida a gratuidade da justiça, tal benesse conserva-se em todas as instâncias e para todos os atos do processo, salvo se expressamente revogada”.

2. Na sentença em análise, o Magistrado a quo condenou o autor/apelante ao pagamento dos honorários, sem revogar expressamente a decisão de evento 4 na parte final em que concedeu a benesse e sem suspender a exigibilidade em razão da justiça gratuita anteriormente deferida, em dissonância com a jurisprudência do STJ, devendo a ressalva do art. 98, § 3º, do CPC ser nela acrescentada.

3. O STJ admite a incidência dos juros remuneratórios à taxa média de mercado em operações da espécie, apurados pelo Banco Central do Brasil, quando verificada pelo Tribunal de origem a abusividade do percentual contratado ou a ausência de contratação expressa.

4. Para a caracterização da abusividade dos juros remuneratórios estipulados no contrato discutido, adota-se, por parâmetro, a prova da cobrança dos juros em percentual superior a uma vez e meia à taxa média divulgada pelo Banco Central do Brasil para as operações da mesma espécie e época da contratação.

5. Na tabela divulgada pelo BACEN é possível verificar para o período da celebração do contrato (19/02/2019) que a taxa de juros praticada por 42 instituições bancárias variou de 0,71% ao mês a 4,17% ao mês, o que corresponde a uma média de 1,78% ao mês.

6. No caso concreto, a taxa de juros remuneratórios estipulada no contrato (evento 10, CONTR2) é de 2,16% ao mês, superior apenas 0,38% em relação à taxa média de mercado, não excedendo, assim, a uma vez e meia a taxa de referência (1,78%), razão pela qual deve ser mantida.

7. Em relação à capitalização dos juros, o STJ entende que a periodicidade inferior à anual deve vir pactuada de forma expressa e clara; além disso, a previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada.

8. No caso dos autos, consta expressamente no contrato celebrado entre as partes a previsão da taxa de juros de 2,16% a.m. e de 32,33% a.a. (evento 10, CONTR2, p. 18).

9. Além de a taxa de juros anual estar expressa no contrato, ela não ultrapassa uma vez e meia a taxa média anual de 24,03% aplicada pelas 42 instituições financeiras indicadas na tabela do BACEN para o mesmo período, que variou entre 8,89% a.a. e 63,25% a.a., razão pela qual deve ser mantida.

10. A comissão de permanência é admitida em contratos, desde que não esteja cumulada com correção monetária e com juros remuneratórios e moratórios e multa.

11. Na espécie, da leitura do contrato celebrado entre as partes, em especial da cláusula “Consequências do Atraso no Pagamento”, constata-se que o instrumento não previu a cobrança de comissão de permanência, mas sim, a incidência dos juros remuneratórios até a efetiva liquidação da dívida, mais juros moratórios de 1% ao mês, ou fração, estes incidentes sobre o valor de principal acrescido dos juros remuneratórios, mais multa de 2% aplicada sobre o total da dívida, assim considerada o principal, juros remuneratórios e juros moratórios.

12. Recurso conhecido e parcialmente provido para acrescentar na sentença a suspensão da exigibilidade das obrigações decorrentes da sucumbência, aí incluído o pagamento dos honorários de sucumbência, nos termos do art. 98, § 3º, do CPC, mantendo-a nos demais termos.

 

VOTO

O recurso preenche os requisitos de admissibilidade, devendo ser conhecido.

Conforme relatado, cuida-se de Apelação interposta por Rogério Tavares Rodrigues da Costa contra a sentença (evento 33) proferida pelo juízo da 3ª Vara Cível de Gurupi que rejeitou os pedidos iniciais da Ação de Modificação de Cláusula Contratual c/c Ação Consignatória e Pedido de Tutela de Urgência, com fulcro no art. 487, I, do CPC.

Na origem, Rogério Tavares Rodrigues da Costa ajuizou Ação de Modificação de Cláusula Contratual c/c Ação Consignatória e Pedido de Tutela de Urgência em desfavor do Banco Bradesco Financiamentos S/A com o objetivo de discutir as cláusulas do contrato de CDC n.º 164832694 celebrado entre as partes em 19/02/2019, garantido por alienação fiduciária. Para tanto, explicou ter financiado no valor de R$ 14.410,00, com vencimento em 60 parcelas de R$ 518,39, a primeira vencendo em 19/03/2019 e, a última, em 19/02/2024, mas que o contrato estaria excessivamente onerado. Apontou serem inválidos os seguintes pontos: cobrança de capitalização de juros por ausência de pactuação clara; juros superiores à taxa média de mercado; comissão de permanência no período de inadimplência, devendo ser cobrados apenas juros de mora de 1% ao mês, sem cumulação com outros encargos; todas as despesas de cobrança da dívida extrajudiciais e judiciais, incluindo carta de cobrança. Ao final, requereu autorização para depositar as parcelas vencidas e vincendas no valor de R$ 235,28 ou, se assim não entender, no valor da parcela contratada de R$ 518,39, bem como o julgamento procedente da ação para limitar os juros remuneratórios à taxa média do mercado, afastar a capitalização legal dos juros por ausência de previsão contratual, afastar toda e qualquer cobrança cumulada de juros moratórios, devendo aplicar tão somente a súmula 379/STJ, limitando os juros moratórios em 1% ao mês ou fração, e declarar nula a cláusula que transfere ao consumidor as despesas e o encargo das atividades do fornecedor.

Ao sentenciar, o Magistrado a quo afastou a preliminar de inépcia da inicial e, no mérito, aplicou o CDC à espécie, nos termos da súmula 297/STJ; explicou ser possível mitigar o princípio da força obrigatória dos contratos; verificou que a capitalização de juros, admitida a partir da vigência da MP 1.963-17/2000, sucedida pela MP 2.170-36/2001, foi prevista no contrato celebrado entre as partes, não havendo que se falar em ilegalidade, não sendo devida a limitação dos juros remuneratórios a 12% ao ano. Constatou que o autor não cumpriu o ônus probatório que lhe competia, deixando de comprovar a existência de cláusula que lhe impõe a obrigação de suportar as despesas de cobrança. Por não restarem evidenciadas as supostas abusividades, entendeu que a mora não restou descaracterizada. Assim, julgou improcedente a ação e condenou o autor ao pagamento de honorários advocatícios, fixando-os em 10% sobre o valor da causa.

Inconformado, Rogério Tavares Rodrigues da Costa interpôs o presente recurso (evento 39), defendendo ser possível revisar os juros remuneratórios estipulados no contrato em 2,36% ao mês para fixá-los equivalente à taxa média do mercado à época da contratação, que a capitalização de juros é indevida e que a comissão de permanência estaria disfarçada de juros remuneratórios e seria cobrada cumulada com outros encargos de mora. Pugnou pela concessão da justiça gratuita em sede recursal e a reforma da sentença para julgar procedente a ação.

Em contrarrazões (evento 44) o Banco Bradesco Financiamentos S/A defendeu a validade das cláusulas contratuais e, ao final, pugnou pelo não provimento do recurso.

Passo ao julgamento.

O cerne da questão é averiguar se deve ser reformada a sentença que julgou improcedente a ação por não constatar qualquer ilegalidade no contrato celebrado entre as partes.

O apelante se insurge contra os juros remuneratórios, a capitalização de juros e a comissão de permanência. Além disso, requereu a concessão da justiça gratuita.

1. Gratuidade de justiça.

Inicialmente, no que se refere à concessão da justiça gratuita, verifico que o benefício foi concedido na decisão de evento 4, sem que houvesse qualquer revogação posterior.

Ocorre que, ao sentenciar, o Magistrado a quo condenou o autor/apelante ao pagamento dos honorários, sem revogar expressamente a decisão de evento 4 na parte final em que concedeu a benesse e sem ressalvar a suspensão da exigibilidade em razão da justiça gratuita anteriormente deferida.

Acerca da matéria, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que, “uma vez concedida a gratuidade da justiça, tal benesse conserva-se em todas as instâncias e para todos os atos do processo, salvo se expressamente revogada”. Nesse sentido:

AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. EMBARGOS À EXECUÇÃO. 1. APELAÇÃO. DESERÇÃO. CONCESSÃO DE GRATUIDADE DE JUSTIÇA QUE SE ESTENDE A TODOS OS ATOS DO PROCESSO, ENQUANTO NÃO REVOGADA EXPRESSAMENTE. 2. EVENTUAL OMISSÃO DO JUÍZO A QUO ACERCA DO PEDIDO DE GRATUIDADE DE JUSTIÇA. DEFERIMENTO TÁCITO, A AUTORIZAR A INTERPOSIÇÃO DO RECURSO SEM O RECOLHIMENTO DO PREPARO RESPECTIVO. 3. APLICAÇÃO DA MULTA PREVISTA NO § 4º DO ART. 1.021 DO CPC/2015. NÃO CABIMENTO NA HIPÓTESE. 4. AGRAVO DESPROVIDO. 1. A jurisprudência deste Superior Tribunal dispõe no sentido de que, uma vez concedida a gratuidade da justiça, tal benesse conserva-se em todas as instâncias e para todos os atos do processo, salvo se expressamente revogada. 2. A Corte Especial do STJ assenta que se presume "o deferimento do pedido de assistência judiciária gratuita não expressamente indeferido por decisão fundamentada, inclusive na instância especial. [...] A ausência de manifestação do Judiciário quanto ao pedido de assistência judiciária gratuita leva à conclusão de seu deferimento tácito, a autorizar a interposição do recurso cabível sem o correspondente preparo" (AgRg nos EAREsp 440.971/RS, Rel. Ministro Raul Araújo, Corte Especial, julgado em 3/2/2016, DJe 17/3/2016). 3. A aplicação da multa prevista no § 4º do art. 1.021 do CPC/2015 não é automática, não se tratando de mera decorrência lógica do desprovimento do agravo interno em votação unânime, devendo ser analisado em caso concreto o caráter abusivo ou protelatório do recurso, o que não se verifica na hipótese. 4. Agravo interno desprovido. (AgInt no AREsp 1137758/SP, Rel. Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, TERCEIRA TURMA, julgado em 04/05/2020, DJe 08/05/2020) – grifei.

Assim, a parte se encontra acobertada pela justiça gratuita, uma vez que não consta dos autos qualquer demonstração da modificação da capacidade financeira do autor/apelante desde a data em que a benesse foi concedida, bem como não consta decisão fundamentada revogando o benefício concedido na decisão de evento 4.

2. Juros remuneratórios.

O apelante defende a possibilidade de revisar os juros remuneratórios estipulados no contrato em 2,36% ao mês para fixá-los equivalente à taxa média do mercado à época da contratação.

Em relação ao tema, o STJ admite a incidência dos juros remuneratórios à taxa média de mercado em operações da espécie, apurados pelo Banco Central do Brasil, quando verificada pelo Tribunal de origem a abusividade do percentual contratado ou a ausência de contratação expressa. Nesse sentido:

AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. DIREITO DO CONSUMIDOR. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO. JUROS REMUNERATÓRIOS. AUSÊNCIA DA ABUSIVIDADE. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. CONTRATAÇÃO EXPRESSA. DESCARACATERIZAÇÃO DA MORA. NÃO CABIMENTO. 1. Consoante a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, os juros remuneratórios incidem à taxa média de mercado em operações da espécie, apurados pelo Banco Central do Brasil, quando verificada pelo Tribunal de origem a abusividade do percentual contratado ou a ausência de contratação expressa. 2. No caso concreto, o Tribunal de Justiça asseverou que não se constata abusividade contratual no referido encargo, pois a taxa dos juros remuneratórios encontra-se em consonância com a taxa média de mercado divulgada pelo Banco Central do Brasil para o período da contratação. 3. Dessa forma, para infirmar as conclusões do aresto combatido, seria imprescindível o reexame de provas e a análise das cláusulas contratuais, o que é inadmissível nesta instância extraordinária, sob pena de incidirem os Enunciados n.º 5 e 7/STJ. 4. Conforme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a capitalização dos juros em periodicidade inferior à anual deve vir pactuada de forma expressa e clara, bem como a previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada. 5. No caso concreto, o Tribunal de Justiça destacou que há expressa previsão no instrumento contratual de capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano, restando evidenciada a legitimidade de sua cobrança, além de que há previsão de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal. 6. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça flui no sentido de que não há se falar em descaracterização da mora se os encargos pactuados para incidir durante a normalidade contratual foram cobrados de forma regular. 7. Não apresentação de argumentos novos capazes de infirmar os fundamentos que alicerçaram a decisão agravada. 8. AGRAVO INTERNO CONHECIDO E DESPROVIDO. (AgInt no REsp 1970036/RS, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 25/04/2022, DJe 27/04/2022) – grifei.

Para a caracterização da abusividade dos juros remuneratórios estipulados no contrato discutido, adota-se, por parâmetro, a prova da cobrança dos juros em percentual superior a uma vez e meia à taxa média divulgada pelo Banco Central do Brasil para as operações da mesma espécie e época da contratação. Nesse sentido:

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE REVISÃO DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS. FINANCIAMENTO DE VEÍCULO. LIMITAÇÃO E CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. SÚMULA 539 DO STJ. AUTORIZAÇÃO LEGAL. LIMITAÇÃO DE JUROS REMUNERATÓRIOS A 12% AO ANO. INAPLICABILIDADE. POSSIBILIDADE DE REVISÃO CONTRATUAL. TAXA DE JUROS LIMITADA À TAXA MÉDIA DE MERCADO DIVULGADA PELO BANCO CENTRAL. ABUSIVIDADE NÃO CONSTATADA. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. LEGALIDADE DA COBRANÇA SEM CUMULAÇÃO. CUMULAÇÃO COM OUTROS ENCARGOS NÃO EVIDENCIADA. APLICAÇÃO DA TABELA PRICE. LEGALIDADE. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. 1- A limitação e a capitalização mensal de juros em contratos bancários são permitidas pelo ordenamento jurídico, eis que as instituições financeiras não se submetem às disposições do Decreto-Lei nº 22.626/33 (Lei de Usura), por força da Súmula nº 596 do STF. O STJ autoriza a capitalização dos juros em periodicidade superior a 12% anual quando pactuada expressamente no contrato. 2- Frisa-se, que os juros não ficam limitados a 12% ao ano e a estipulação de juros remuneratórios superior a 12% ao ano não indica abusividade (Súmula 382, do STJ), contudo, ser observada a taxa média de mercado apurada entre as instituições financeiras, como orientação para a análise da existência ou não de abusividade do percentual contratado. 3- A taxa de juros convencionada entre as partes não excede a média do mercado cobrada à época da pactuação do contrato de financiamento em epígrafe, não havendo, assim, que se falar em abusividade. 4- Não há se falar em abusividade da cobrança de juros, não havendo discrepância entre a taxa contratada, que inclusive é inferior à taxa média de mercado entre as instituições financeiras apurada pelo Banco Central do Brasil à época da contratação, portanto, há de se manter o percentual contratado pelas partes. 5- Quanto a comissão de permanência esta é legal, desde que não seja cumulada com qualquer outro encargo, e seu valor não ultrapasse a soma dos encargos remuneratórios e moratórios previstos no contrato (Súmula de nº 472 do STJ). Contudo, não pactuada a cobrança do referido encargo. Assim, ao contrário do alegado pelo magistrado de piso, não há se falar em afastamento de dos encargos cumulados à comissão de permanência, pois, não restou demonstrado no contrato sua cobrança, ficando prejudicada a análise de sua abusividade no caso concreto. 6- A utilização da tabela Price não caracteriza, necessariamente, prática de anatocismo, uma vez que não se vislumbra a incidência de juros sobre juros vencidos e não pagos, mas sim o calculo de juros compostos, objetivando uniformização dos valores das prestações. 7- Recurso conhecido e improvido. (Apelação Cível 0008927-25.2019.8.27.2729, Rel. EURÍPEDES LAMOUNIER, GAB. DO DES. EURÍPEDES LAMOUNIER, julgado em 23/02/2022, DJe 07/03/2022 14:52:03)

APELAÇÃO CÍVEL - AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO - AUSÊNCIA DE VÍCIO DO CONSENTIMENTO OU FALHA NO DEVER DE INFORMAÇÃO - CLÁUSULAS CONTRATUAIS EXPRESSAS E CLARAS - EMPRÉSTIMO PESSOAL NÃO CONSIGNADO - ALTERAÇÃO DA MODALIDADE CONTRATUAL - IMPOSSIBILIDADE - TAXA DE JUROS EXCESSIVA - REVISÃO - CABIMENTO - NECESSIDADE DE READEQUAÇÃO À MÉDIA PRATICADA NO MERCADO - REPETIÇÃO DE INDÉBITO NA FORMA SIMPLES CONDICIONADA À COMPENSAÇÃO DE VALORES - DANO MORAL NÃO CONFIGURADO - MERO DESACORDO COMERCIAL - APELO PARCIALMENTE PROVIDO. 1 - Diante do contexto fático apurado nos autos resta inviável acolher a pretensão de se fixar a taxa de juros nos moldes requestados pelo apelante, equiparando a modalidade contratual efetivamente pactuada (empréstimo pessoal com desconto em conta corrente) ao empréstimo consignado com desconto em folha de pagamento, vez que tal providência implicaria certo desvirtuamento do  chamado "dirigismo contratual", em uma seara onde impera a liberdade de atuação própria da iniciativa privada, com a ressalva dos regramentos delineados pelos órgãos de controle do sistema financeiro, a exemplo das normativas publicadas pelo Banco Central do Brasil e do Conselho Monetário Nacional. 2 - Consta nos autos de origem que a taxa de juros contratada pelo apelante em julho de 2019 foi de 22,00% ao mês, conforme Evento 1- CONT_EMPRES7. Em consulta realizada no site do Banco Central do Brasil (https://www.bcb.gov.br/estatisticas/txjuros) verifica-se que naquele período, a taxa de juros praticada por 69 instituições financeiras, para a modalidade de "crédito pessoal não consignado", variou de 0,81% a 27,31 % ao mês, o que corresponde a uma média de 7,79% ao mês. 3 - O colendo Superior Tribunal de Justiça já considerou em reiterados julgamentos, de acordo com o caso concreto, como abusivas as taxas de juros superiores a uma vez e meia, ao dobro ou ao triplo da média, conforme destacado pela Ministra Nanci Andrighi, nos autos do REsp 1.061.530/RS. Neste contexto, e dentro do microssistema regulado pela legislação consumerista, reputa-se excessiva a taxa de juros estipulada em 22% (vinte e dois por cento ao mês) e 987,22% (novecentos e oitenta e sete vírgula vinte e dois por cento) ao ano, razão pela qual deve ser revista para se adequar à taxa média praticada no mercado ao tempo da contratação (Julho de 2019), conforme dados apurados pelo Banco Central do Brasil para os empréstimos pessoais não consignados, também chamados de empréstimos na modalidade tradicional. 4 - No que se refere ao pedido de repetição de indébito na forma dobrada, bem como ao pedido de indenização por danos morais, melhor sorte não assiste ao recorrente na medida em que o pagamento ocorreu nos termos que haviam sido previamente pactuados entres as partes, com especial relevo para o fato de que não há sequer indícios de que o autor tenha sido induzido a algum erro, ou tenha havido alguma fraude, pois o contrato objeto da ação revisional contém as informações necessárias em relação à taxa de juros mensal e anual, com a indicação expressa, tanto da modalidade contratual, quanto do valor e número de parcelas a serem pagas, de modo que resta deveras insubsistente a tese de que possa ter havido uma contratação diversa daquela pretendida pelo tomador do empréstimo. 5 - Apelação parcialmente provida para fixar ao contrato de empréstimo que instrui a exordial a taxa mensal de juros de 7,79%, correspondente à média praticada no mercado e informada pelo Banco Central do Brasil, para os empréstimos pessoais não consignados, realizados em julho de 2019. (Apelação/Remessa Necessária 0002732-23.2020.8.27.2718, Rel. MAYSA VENDRAMINI ROSAL, GAB. DA DESA. MAYSA VENDRAMINI ROSAL, julgado em 09/02/2022, DJe 21/02/2022 11:59:15) – grifei.

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO REVISIONAL DE CLÁUSULAS CONTRATUAIS C/C OBRIGAÇÃO DE FAZER E INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS E REPETIÇÃO DE INDÉBITO. CERCEAMENTO DE DEFESA. INOCORRÊNCIA. CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR. APLICABILIDADE. JUROS REMUNERATÓRIOS. ABUSIVIDADE. NECESSIDADE DE DEMONSTRAÇÃO INEQUÍVOCA. COBRANÇA DE JUROS. LEGALIDADE. TARIFA DE CADASTRO. CET - LEGALIDADE. REPETIÇÃO DO INDÉBITO. NÃO CABIMENTO. CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. HONORÁRIOS RECURSAIS MAJORADOS - R$ 800,00. 1. Se a matéria a ser analisada em ação revisional é exclusivamente de direito, a realização de perícia contábil torna-se desnecessária. Assim, seu indeferimento não caracteriza cerceamento de defesa. 2. Nos termos da Súmula 297 do STJ, "o Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras". 3. Os juros remuneratórios praticados pelas instituições financeiras não estão limitados a 12% ao ano. Em caso de abusividade ou ausência de estipulação da taxa nos contratos com disponibilização imediata do capital, os juros remuneratórios devem ser limitados à taxa média divulgada pelo Banco Central do Brasil para as operações da mesma espécie e época da contratação, salvo se a taxa cobrada for mais vantajosa para o cliente. Para a configuração da abusividade, adota-se, por parâmetro, a prova da cobrança dos juros em percentual superior a uma vez e meia à taxa média divulgada pelo Banco Central do Brasil para as operações da mesma espécie e época da contratação. 4. Denota-se da leitura da CARACTERÍSTICA DA OPERAÇÃO que, a taxa de juros remuneratórios foi de 2,07% a.m, não podendo ser reputada como excessiva. O autor/apelante, portanto, não tem razão em tal tópico de seu recurso. 5. O CET (Custo Efetivo Total), reflete apenas o custo total do contrato, levando em conta todos os encargos, tarifas e tributos. Tratando-se de índice meramente informativo, não há que se falar, para este efeito, em cobrança indevida e, consequentemente, em restituição de valores. 6 Inexistindo qualquer comprovação nos autos de que a instituição financeira agiu de má-fé, não há que se falar em repetição em dobro do indébito. 7. Recurso que se nega provimento mantendo inalterada a sentença de primeiro grau. Ante o improvimento recursal, majora-se os honorários advocatícios fixados, em desfavor da autora/apelante, para R$ 800,00 (oitocentos reais) (art. 85, § 11, do CPC). Contudo, suspensa a exigibilidade das verbas, na forma do art. 98, § 3º, do CPC. (Apelação Cível 0001012-40.2019.8.27.2723, Rel. ADOLFO AMARO MENDES, GAB. DO DES. ADOLFO AMARO MENDES, julgado em 09/02/2022, DJe 18/02/2022 17:03:03) – grifei.

Em pesquisa realizada no site do Banco Central do Brasil – BACEN1, é possível apurar a taxa de juros cobrada por 42 instituições financeiras em 15/02/2019, data mais próxima àquela em que as partes celebraram o contrato discutido nos autos (19/02/2019), aplicada a contrato na modalidade “pessoa física – aquisição de veículos”, mesma modalidade do instrumento em análise.

Na tabela do BACEN é possível verificar para aquele período que a taxa de juros praticada por 42 instituições bancárias variou de 0,71% ao mês a 4,17% ao mês, o que corresponde a uma média de 1,78% ao mês.

No caso concreto, a taxa de juros remuneratórios estipulada no contrato (evento 10, CONTR2) é de 2,16% ao mês, superior apenas 0,38% em relação à taxa média de mercado, não excedendo, assim, a uma vez e meia a taxa de referência (1,78%).

Portanto, a taxa de juros remuneratórios fixada no contrato celebrado entre as partes não pode ser considerada abusiva, razão pela qual deve ser mantida.

3. Capitalização de juros.

O apelante afirma ser indevida a capitalização de juros.

O Supremo Tribunal Federal firmou entendimento de que a norma do § 3º do art. 192 da CRFB/1988, revogada pela Emenda Constitucional n.º 40/2003, que limitava a taxa de juros reais a 12% ao ano, não era auto aplicável. Também sedimentou a tese de que o art. 25 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias - ADCT não revogou a Lei n. 4.595/64. Nesse sentido:

Súmula Vinculante nº 7: "A norma do §3º do artigo 192 da Constituição, revogada pela Emenda Constitucional nº 40/2003, que limitava a taxa de juros reais a 12% ao ano, tinha sua aplicação condicionada à edição de lei complementar".

CONSTITUCIONAL. TAXA DE JUROS BANCÁRIOS. ART. 25 DO ADCT: NÃO REVOGAÇÃO DA LEI 4.595/64. 1. O art. 25 do ADCT não revogou a Lei 4.595/64. Precedentes. 2. Agravo regimental improvido. (RE 395171 AgR, Relator(a): Min. ELLEN GRACIE, Segunda Turma, julgado em 24/11/2009, DJe-232 DIVULG 10-12-2009 PUBLIC 11-12-2009 EMENT VOL-02386-03 PP-00564).

Por sua vez, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que a capitalização dos juros em periodicidade inferior à anual deve vir pactuada de forma expressa e clara; além disso, a previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada. Nesse sentido:

AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. DIREITO DO CONSUMIDOR. ALIENAÇÃO FIDUCIÁRIA. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO. JUROS REMUNERATÓRIOS. AUSÊNCIA DA ABUSIVIDADE. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. CONTRATAÇÃO EXPRESSA. DESCARACATERIZAÇÃO DA MORA. NÃO CABIMENTO. 1. Consoante a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, os juros remuneratórios incidem à taxa média de mercado em operações da espécie, apurados pelo Banco Central do Brasil, quando verificada pelo Tribunal de origem a abusividade do percentual contratado ou a ausência de contratação expressa. 2. No caso concreto, o Tribunal de Justiça asseverou que não se constata abusividade contratual no referido encargo, pois a taxa dos juros remuneratórios encontra-se em consonância com a taxa média de mercado divulgada pelo Banco Central do Brasil para o período da contratação. 3. Dessa forma, para infirmar as conclusões do aresto combatido, seria imprescindível o reexame de provas e a análise das cláusulas contratuais, o que é inadmissível nesta instância extraordinária, sob pena de incidirem os Enunciados n.º 5 e 7/STJ. 4. Conforme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, a capitalização dos juros em periodicidade inferior à anual deve vir pactuada de forma expressa e clara, bem como a previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada. 5. No caso concreto, o Tribunal de Justiça destacou que há expressa previsão no instrumento contratual de capitalização de juros com periodicidade inferior a um ano, restando evidenciada a legitimidade de sua cobrança, além de que há previsão de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal. 6. A jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça flui no sentido de que não há se falar em descaracterização da mora se os encargos pactuados para incidir durante a normalidade contratual foram cobrados de forma regular. 7. Não apresentação de argumentos novos capazes de infirmar os fundamentos que alicerçaram a decisão agravada. 8. AGRAVO INTERNO CONHECIDO E DESPROVIDO. (AgInt no REsp 1970036/RS, Rel. Ministro PAULO DE TARSO SANSEVERINO, TERCEIRA TURMA, julgado em 25/04/2022, DJe 27/04/2022)

No caso dos autos, consta expressamente no contrato celebrado entre as partes a previsão da taxa de juros de 2,16% a.m. e de 32,33% a.a. (evento 10, CONTR2, p. 18).

Além de a taxa de juros anual estar expressa no contrato, ela não ultrapassa uma vez e meia a taxa média anual de 24,03% aplicada pelas 42 instituições financeiras indicadas na tabela do BACEN para o mesmo período, que variou entre 8,89% a.a. e 63,25% a.a..

Portanto, a capitalização de juros deve ser mantida na forma em que contratada, pois, uma vez prevista no instrumento e não demonstrada a abusividade, é plenamente devida.

4. Comissão de permanência.

O apelante afirmou que a comissão de permanência estaria disfarçada de juros remuneratórios e seria cobrada cumulada com outros encargos de mora.

Conforme a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, admite-se a comissão de permanência em contratos, desde que não esteja cumulada com correção monetária e com juros remuneratórios e moratórios e multa. Nesse sentido:

AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL ? AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO - DECISÃO MONOCRÁTICA QUE NEGOU PROVIMENTO AO RECLAMO. INSURGÊNCIA DA PARTE DEMANDADA. 1. Segundo a jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça, ?Relativamente à comissão de permanência, firmou-se o entendimento de que pode ser autorizada, de acordo com o enunciado n. 294 da Súmula deste Tribunal, desde que sem cumulação com correção monetária (enunciado n. 30 da Súmula) e com juros remuneratórios e moratórios e multa? (AgInt no AREsp 1802635/RS, Rel. Ministra MARIA ISABEL GALLOTTI, QUARTA TURMA, julgado em 28/06/2021, DJe 30/06/2021). Incidência da Súmula 83 do STJ. 2. Agravo interno desprovido. (AgInt no REsp 1951828/PR, Rel. Ministro MARCO BUZZI, QUARTA TURMA, julgado em 28/03/2022, DJe 31/03/2022)

Todavia, da leitura do contrato celebrado entre as partes, em especial da cláusula “Consequências do Atraso no Pagamento”, constata-se que o instrumento previu, para a hipótese de atraso, a incidência dos juros remuneratórios até a efetiva liquidação da dívida, mais juros moratórios de 1% ao mês, ou fração, estes incidentes sobre o valor de principal acrescido dos juros remuneratórios, mais multa de 2% aplicada sobre o total da dívida, assim considerada o principal, juros remuneratórios e juros moratórios.

Portanto, não houve a previsão de incidência da comissão de permanência, razão pela qual a cláusula em questão é válida.

Como se vê, com exceção da questão relativa à justiça gratuita, a sentença está em conformidade com a jurisprudência aplicável à espécie, de modo que deve ser mantida nos termos em que proferida, com acréscimo da suspensão da exigibilidade dos honorários de sucumbência, nos termos do art. 98, § 3º, do CPC.

Diante do exposto, voto no sentido de DAR PARCIAL PROVIMENTO ao recurso para acrescentar na sentença a suspensão da exigibilidade das obrigações decorrentes da sucumbência, aí incluído o pagamento dos honorários de sucumbência, nos termos do art. 98, § 3º, do CPC, mantendo-a nos demais termos.



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1. https://www.bcb.gov.br/estatisticas/reporttxjuroshistorico/

 


Documento:528246
Poder Judiciário
JUSTIÇA ESTADUAL
Tribunal de Justiça do Estado do Tocantins
GAB. DA DESA. ANGELA PRUDENTE

Apelação Cível Nº 0001495-05.2021.8.27.2722/TO

RELATORA: Desembargadora ANGELA MARIA RIBEIRO PRUDENTE

APELANTE: ROGÉRIO TAVARES RODRIGUES DA COSTA (AUTOR)

ADVOGADO: JOSSERRAND MASSIMO VOLPON (OAB TO05393A)

APELADO: BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A. (RÉU)

ADVOGADO: CARLA PASSOS MELHADO COCHI (OAB SP187329)

EMENTA: APELAÇÃO. REVISIONAL DE CONTRATO BANCÁRIO E CONSIGNAÇÃO EM PAGAMENTO. GRATUIDADE DE JUSTIÇA. AUSÊNCIA DE REVOGAÇÃO EXPRESSA. MANTIDA. JUROS REMUNERATÓRIOS. ABUSIVIDADE NÃO CONSTATADA. CAPITALIZAÇÃO DE JUROS. PREVISÃO EM CONTRATO. COMISSÃO DE PERMANÊNCIA. AUSÊNCIA DE PREVISÃO CONTRATUAL E COBRANÇA. RECURSO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO.

1. O Superior Tribunal de Justiça entende que, “uma vez concedida a gratuidade da justiça, tal benesse conserva-se em todas as instâncias e para todos os atos do processo, salvo se expressamente revogada”.

2. Na sentença em análise, o Magistrado a quo condenou o autor/apelante ao pagamento dos honorários, sem revogar expressamente a decisão de evento 4 na parte final em que concedeu a benesse e sem suspender a exigibilidade em razão da justiça gratuita anteriormente deferida, em dissonância com a jurisprudência do STJ, devendo a ressalva do art. 98, § 3º, do CPC ser nela acrescentada.

3. O STJ admite a incidência dos juros remuneratórios à taxa média de mercado em operações da espécie, apurados pelo Banco Central do Brasil, quando verificada pelo Tribunal de origem a abusividade do percentual contratado ou a ausência de contratação expressa.

4. Para a caracterização da abusividade dos juros remuneratórios estipulados no contrato discutido, adota-se, por parâmetro, a prova da cobrança dos juros em percentual superior a uma vez e meia à taxa média divulgada pelo Banco Central do Brasil para as operações da mesma espécie e época da contratação.

5. Na tabela divulgada pelo BACEN é possível verificar para o período da celebração do contrato (19/02/2019) que a taxa de juros praticada por 42 instituições bancárias variou de 0,71% ao mês a 4,17% ao mês, o que corresponde a uma média de 1,78% ao mês.

6. No caso concreto, a taxa de juros remuneratórios estipulada no contrato (evento 10, CONTR2) é de 2,16% ao mês, superior apenas 0,38% em relação à taxa média de mercado, não excedendo, assim, a uma vez e meia a taxa de referência (1,78%), razão pela qual deve ser mantida.

7. Em relação à capitalização dos juros, o STJ entende que a periodicidade inferior à anual deve vir pactuada de forma expressa e clara; além disso, a previsão no contrato bancário de taxa de juros anual superior ao duodécuplo da mensal é suficiente para permitir a cobrança da taxa efetiva anual contratada.

8. No caso dos autos, consta expressamente no contrato celebrado entre as partes a previsão da taxa de juros de 2,16% a.m. e de 32,33% a.a. (evento 10, CONTR2, p. 18).

9. Além de a taxa de juros anual estar expressa no contrato, ela não ultrapassa uma vez e meia a taxa média anual de 24,03% aplicada pelas 42 instituições financeiras indicadas na tabela do BACEN para o mesmo período, que variou entre 8,89% a.a. e 63,25% a.a., razão pela qual deve ser mantida.

10. A comissão de permanência é admitida em contratos, desde que não esteja cumulada com correção monetária e com juros remuneratórios e moratórios e multa.

11. Na espécie, da leitura do contrato celebrado entre as partes, em especial da cláusula “Consequências do Atraso no Pagamento”, constata-se que o instrumento não previu a cobrança de comissão de permanência, mas sim, a incidência dos juros remuneratórios até a efetiva liquidação da dívida, mais juros moratórios de 1% ao mês, ou fração, estes incidentes sobre o valor de principal acrescido dos juros remuneratórios, mais multa de 2% aplicada sobre o total da dívida, assim considerada o principal, juros remuneratórios e juros moratórios.

12. Recurso conhecido e parcialmente provido para acrescentar na sentença a suspensão da exigibilidade das obrigações decorrentes da sucumbência, aí incluído o pagamento dos honorários de sucumbência, nos termos do art. 98, § 3º, do CPC, mantendo-a nos demais termos.

ACÓRDÃO

A Egrégia 2ª Turma da 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Tocantins decidiu, por unanimidade, DAR PARCIAL PROVIMENTO ao recurso para acrescentar na sentença a suspensão da exigibilidade das obrigações decorrentes da sucumbência, aí incluído o pagamento dos honorários de sucumbência, nos termos do art. 98, § 3º, do CPC, mantendo-a nos demais termos, nos termos do voto da Relatora.

Votaram acompanhando a Relatora o Desembargador Eurípedes Lamounier e o Juiz Jocy Gomes de Almeida.

Representante da Procuradoria Geral de Justiça: Dr. Marcos Luciano Bignoti.

Palmas, 25 de maio de 2022.



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Documento:528244
Poder Judiciário
JUSTIÇA ESTADUAL
Tribunal de Justiça do Estado do Tocantins
GAB. DA DESA. ANGELA PRUDENTE

Apelação Cível Nº 0001495-05.2021.8.27.2722/TO

RELATORA: Desembargadora ANGELA MARIA RIBEIRO PRUDENTE

APELANTE: ROGÉRIO TAVARES RODRIGUES DA COSTA (AUTOR)

ADVOGADO: JOSSERRAND MASSIMO VOLPON (OAB TO05393A)

APELADO: BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A. (RÉU)

ADVOGADO: CARLA PASSOS MELHADO COCHI (OAB SP187329)

RELATÓRIO

Cuida-se de Apelação interposta por Rogério Tavares Rodrigues da Costa contra a sentença (evento 33) proferida pelo juízo da 3ª Vara Cível de Gurupi que rejeitou os pedidos iniciais da Ação de Modificação de Cláusula Contratual c/c Ação Consignatória e Pedido de Tutela de Urgência, com fulcro no art. 487, I, do CPC.

Na origem, Rogério Tavares Rodrigues da Costa ajuizou Ação de Modificação de Cláusula Contratual c/c Ação Consignatória e Pedido de Tutela de Urgência em desfavor do Banco Bradesco Financiamentos S/A com o objetivo de discutir as cláusulas do contrato de CDC n.º 164832694 celebrado entre as partes em 19/02/2019, garantido por alienação fiduciária. Para tanto, explicou ter financiado no valor de R$ 14.410,00, com vencimento em 60 parcelas de R$ 518,39, a primeira vencendo em 19/03/2019 e, a última, em 19/02/2024, mas que o contrato estaria excessivamente onerado. Apontou serem inválidos os seguintes pontos: cobrança de capitalização de juros por ausência de pactuação clara; juros superiores à taxa média de mercado; comissão de permanência no período de inadimplência, devendo ser cobrados apenas juros de mora de 1% ao mês, sem cumulação com outros encargos; todas as despesas de cobrança da dívida extrajudiciais e judiciais, incluindo carta de cobrança. Ao final, requereu autorização para depositar as parcelas vencidas e vincendas no valor de R$ 235,28 ou, se assim não entender, no valor da parcela contratada de R$ 518,39, bem como o julgamento procedente da ação para limitar os juros remuneratórios à taxa média do mercado, afastar a capitalização legal dos juros por ausência de previsão contratual, afastar toda e qualquer cobrança cumulada de juros moratórios, devendo aplicar tão somente a sumula 379/STJ, limitando os juros moratórios em 1% ao mês ou fração, e declarar nula a cláusula que transfere ao consumidor as despesas e o encargo das atividades do fornecedor.

Ao sentenciar, o Magistrado a quo afastou a preliminar de inépcia da inicial e, no mérito, aplicou o CDC à espécie, nos termos da súmula 297/STJ; explicou ser possível mitigar o princípio da força obrigatória dos contratos; verificou que a capitalização de juros, admitida a partir da vigência da MP 1.963-17/2000, sucedida pela MP 2.170-36/2001, foi prevista no contrato celebrado entre as partes, não havendo que se falar em ilegalidade, não sendo devida a limitação dos juros remuneratórios a 12% ao ano. Constatou que o autor não cumpriu o ônus probatório que lhe competia, deixando de comprovar a existência de cláusula que lhe impõe a obrigação de suportar as despesas de cobrança. Por não restarem evidenciadas as supostas abusividades, entendeu que a mora não restou descaracterizada. Assim, julgou improcedente a ação e condenou o autor ao pagamento de honorários advocatícios, fixando-os em 10% sobre o valor da causa.

Inconformado, Rogério Tavares Rodrigues da Costa interpôs o presente recurso (evento 39), defendendo ser possível revisar os juros remuneratórios estipulados no contrato em 2,36% ao mês para fixá-los equivalente à taxa média do mercado à época da contratação, que a capitalização de juros é indevida e que a comissão de permanência estaria disfarçada de juros remuneratórios e seria cobrada cumulada com outros encargos de mora. Pugnou pela concessão da justiça gratuita em sede recursal e a reforma da sentença para julgar procedente a ação.

Em contrarrazões (evento 44) o Banco Bradesco Financiamentos S/A defendeu a validade das cláusulas contratuais e, ao final, pugnou pelo não provimento do recurso.

É o relatório. Peço dia para julgamento.



Documento eletrônico assinado por ANGELA MARIA RIBEIRO PRUDENTE, Relatora, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Instrução Normativa nº 5, de 24 de outubro de 2011. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.tjto.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 528244v2 e do código CRC 567e7a86.

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Extrato de Ata
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Tocantins

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO ORDINÁRIA DE 25/05/2022

Apelação Cível Nº 0001495-05.2021.8.27.2722/TO

RELATORA: Desembargadora ANGELA MARIA RIBEIRO PRUDENTE

PROCURADOR(A): MARCOS LUCIANO BIGNOTI

APELANTE: ROGÉRIO TAVARES RODRIGUES DA COSTA (AUTOR)

ADVOGADO: JOSSERRAND MASSIMO VOLPON (OAB TO05393A)

APELADO: BANCO BRADESCO FINANCIAMENTOS S.A. (RÉU)

ADVOGADO: CARLA PASSOS MELHADO COCHI (OAB SP187329)

Certifico que a 2ª CÂMARA CÍVEL, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 2ª TURMA JULGADORA DA 2ª CÂMARA CÍVEL DECIDIU, POR UNANIMIDADE, DAR PARCIAL PROVIMENTO AO RECURSO PARA ACRESCENTAR NA SENTENÇA A SUSPENSÃO DA EXIGIBILIDADE DAS OBRIGAÇÕES DECORRENTES DA SUCUMBÊNCIA, AÍ INCLUÍDO O PAGAMENTO DOS HONORÁRIOS DE SUCUMBÊNCIA, NOS TERMOS DO ART. 98, § 3º, DO CPC, MANTENDO-A NOS DEMAIS TERMOS.

RELATORA DO ACÓRDÃO: Desembargadora ANGELA MARIA RIBEIRO PRUDENTE

Votante: Desembargadora ANGELA MARIA RIBEIRO PRUDENTE

Votante: Juiz JOCY GOMES DE ALMEIDA

Votante: Desembargador EURÍPEDES LAMOUNIER

CARLOS GALVÃO CASTRO NETO

Secretário

MANIFESTAÇÕES DOS MAGISTRADOS VOTANTES

Acompanha o(a) Relator(a) - GAB. DO DES. EURÍPEDES LAMOUNIER - Desembargador EURÍPEDES LAMOUNIER.