Documento:840084
Poder Judiciário
JUSTIÇA ESTADUAL
Tribunal de Justiça do Estado do Tocantins
GAB. DO DES. PEDRO NELSON DE MIRANDA COUTINHO

Apelação Criminal (PROCESSO ORIGINÁRIO EM MEIO ELETRÔNICO) Nº 0001884-42.2021.8.27.2737/TO

RELATOR: Desembargador PEDRO NELSON DE MIRANDA COUTINHO

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO (AUTOR)

APELADO: JOSE BONFIM RIBEIRO CARVALHO (RÉU)

ADVOGADO(A): ESTELAMARIS POSTAL (DPE)

VOTO

EMENTA: PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. SENTENÇA PROCEDEU A DESCLASSIFICAÇÃO PARA O CRIME DE USO. RECURSO MINISTERIAL. AUSÊNCIA DE PROVA SEGURA DO SUPOSTO ENVOLVIMENTO DO RÉU NO TRÁFICO DE DROGAS. PEQUENA QUANTIDADE DE DROGA. DEPOIMENTOS DOS POLICIAIS NÃO FORAM CONCLUSIVOS. ENVOLVIMENTO COM FACÕES NÃO CONSTATADO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

1. Ante o fato de o apelante não ser reincidente em tráfico, a pequena quantidade de drogas apreendia e tendo em vista que nenhum Policial viu o apelante comercializando drogas, verifica-se que a desclassificação deve ser mantida.

2. No delito de tráfico, a existência de meros indícios não autoriza o decreto condenatório, devendo estar comprovada, de forma segura e firme, a traficância exercida pelo acusado, em observância ao princípio in dubio pro reo. Não havendo provas de que a droga apreendida em poder do réu se destinava à comercialização e se as circunstâncias indicam que a substância se destinava ao seu próprio consumo, impõe-se a desclassificação do delito de tráfico para o de uso de substância entorpecente, como realizado pelo magistrado de origem.

3. Recurso conhecido e não provido.

Conforme relatado, trata-se de recurso de APELAÇÃO CRIMINAL interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO (interposição no evento 84 e razões no evento 92, ambos da ação originária) contra sentença proferida pelo JUÍZO DA 1ª VARA CRIMINAL DE PORTO NACIONAL no evento 78 da AÇÃO PENAL N. 00018844220218272737, tendo como apelado JOSE BONFIM RIBEIRO CARVALHO (contrarrazões no evento 95 do processo originário).

O recorrido JOSE BONFIM RIBEIRO CARVALHO teve sua conduta desclassificada do artigo 33 da Lei n. 11.343/06 (tráfico de drogas), como exposto na denúncia, para o crime do artigo 28 da Lei n. 11.343/06 (uso próprio), com a consequente remessa dos autos ao Juizado Especial Criminal.

A decisão recorrida fundamentou que policiais militares estavam em patrulhamento, oportunidade em que “populares” repassaram a informação indicando um ponto de venda e consumo de drogas. Ao chegarem na localidade, encontraram o recorrido e outro indivíduo (também denunciado cuja ação foi desmembrada). Ao procederem a busca pessoal, encontraram aproximadamente 23,1 gramas de maconha e a quantia de R$88,00. Parte da substância estava dividida (15,20g), o restante em uma única porção (8,20g). Entretanto, o magistrado de primeira instância constatou que nenhum dos policiais presenciou as condutas de traficância, ouviu os réus confessarem a traficância ou mesmo conheciam os réus como traficantes da região.

Pelo contrário, segundo as testemunhas, os presos afirmaram que a droga era destinada ao uso. Além disso, o recorrido: é primário; não respondia a outros processos; não tinha envolvimento com facção criminosa; não estava com balança, anotações, artefatos ou uma grande quantidade de substâncias entorpecentes. Diante disso o sentenciante concluiu que há uma dúvida clara a respeito da comercialização da droga apreendida e, por isso, desclassificou a conduta. 

Em sua impugnação, o apelante pleiteia a condenação nos termos da denúncia.

Contrarrazões pelo não provimento do recurso.

Com vista, o Órgão de Cúpula Ministerial emitiu parecer em 07/07/2023, evento 09, manifestando-se pelo conhecimento e provimento do recurso.

Com efeito. Presentes os requisitos de admissibilidade do recurso, dele conheço. No mérito, passo ao voto.

A denúncia relata que (evento 1 do processo originário):

[...] Constam dos presentes autos que, no dia 06 de Janeiro de 2021, por volta das 11h30min, na Av. Fortaleza, s/nº, Setor Novo Planalto, nesta cidade de Porto Nacional/TO, os denunciados traziam consigo para fins de tráfico, aproximadamente 23,1 gramas de Maconha, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, substância esta causadora de dependência física ou psíquica, conforme laudo pericial de constatação de substâncias entorpecentes (Evento-42).

Consta do encarte inquisitorial que, por ocasião dos fatos, Policiais Militares faziam patrulhamento de rotina no Setor Novo Planalto, quando foram informados por populares que havia uma aglomeração de pessoas, com venda de substâncias entorpecentes, nas proximidades da Avenida Fortaleza.

Os castrenses se deslocaram até o referido endereço onde, após efetuarem revista pessoal nos denunciados encontraram, em poder de Marcos Dione Ferreira Damaceno, 12 (doze) unidades da substância conhecida como Maconha, pesando aproximadamente 15,1 gramas e R$ 88,00 (oitenta e oito) reais em espécie, bem como, em poder de José Bonfim Ribeiro Carvalho, 08 (oito) gramas da mesma substância. Diante dos fatos, os denunciados foram presos e conduzidos à Delegacia de Polícia, onde foi lavrado o flagrante.

Em sede de interrogatório, os denunciados confessaram serem os proprietários da droga apreendida, conforme Anexos 6 e 7 do Evento 01 [...]

Após a instrução processual, o magistrado de primeira instância concluiu pela absolvição. Analisando detidamente os autos, irrepreensível a fundamentação do sentenciante. Não restando satisfatoriamente comprovada nos autos a prática do crime, não há que se falar em condenação. Evitando-se tautologia, reprisa-se os fundamentos da primeira instância (evento 78 do processo originário):

[...] Quanto ao mérito, inicialmente, é preciso averiguar se o fato narrado na denúncia e sua autoria foram, com alto grau de probabilidade, demonstrados, por meio de provas produzidos sob o crivo do contraditório e ampla defesa, no processo.

Muito bem. O Ministério Público afirmou, na peça inicial acusatória, que no dia 06 de Janeiro de 2021, por volta das 11h30min, na Av. Fortaleza, s/nº, Setor Novo Planalto, nesta cidade de Porto Nacional/TO, os denunciados traziam consigo para fins de tráfico, aproximadamente 23,1 gramas de Maconha, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar, substância esta causadora de dependência física ou psíquica, conforme laudo pericial de constatação de substâncias entorpecentes de evento 42, do inquérito policial relacionado.

Primeiramente, constata-se  a materialidade  do fato narrado na exordial acusatória por meio do  laudo pericial de constatação de substância entorpecente (evento 42).

[...]

As substâncias periciadas constam da portaria n° 344/98-SVS/MS de 12.05.98, republicada no D.O.U. em 01-02-99, estando inserida na resolução-RDC n° 18 da Agência de Vigilância Sanitária, de 28.01.03; que atualizou as listas de substancias sujeitas a controle especial da supracitada.  A mencionada portaria, em conformidade com o Artigo 66 da Lei 11343/2006.

Quanto á autoria, verifica-se que os depoimentos produzidos sobre o crivo do contraditório e da ampla defesa demonstram, com alta probabilidade, que o processado José Bonfim Ribeiro Carvalho trazia consigo, aproximadamente 23,1 gramas de Maconha, sem autorização ou em desacordo com determinação legal ou regulamentar.

Constata-se, inicialmente, no processo, o  seguinte depoimento do policial penal, Jadivan de Souza Costa: “(...) Que se recorda dos fatos. Que estavam em patrulhamento no setor planalto. Que estava na viatura composta pelo Sargento Jairo e RAFAEL e na oportunidade populares pararam a viatura e reclamaram que na rua atrás onde estavam patrulhando havia uma casa abandonada que estava servindo de local para venda de drogas e usuários. Que se deslocaram em patrulhamento e foram para a localidade indicada e se deparam com  duas pessoas do lado de fora desta residência em vias públicas. Que de imediato fizeram a abordagem. Que o policial Jairo fez a abordagem e localizou no bolso do short do processado Marcos Dione um entorpecente e um valor em dinheiro, não se recorda a quantidade. Que com o outro processado também encontram uma pequena quantidade de drogas. Que todos os entorpecentes foram apresentados, que eram semelhantes à maconha. Que foi dada voz de prisão a eles e os mesmos foram conduzidos à delegacia. Que o processado Marcos Dione confessou que a droga era para uso próprio. Que foram encontradas drogas com os dois. Que não se recorda se conhecia o processado José Bonfim. Que conhece o processado Marcos Dione, onde o mesmo sempre é encontrado com drogas e próximos a locais denominados como “boca de fumo” (...)”.

Por sua vez, o outro policial militar, Rafael Ferreira Rocha, ao ser inquirido, em juízo, respondeu o seguinte: “(...) Que se recorda dos fatos. Que estavam fazendo patrulhamento no setor novo planalto, nas proximidades da Avenida Fortaleza. Que populares informaram que tinham pessoas com atitude suspeita. Que se deslocaram até o local. Que no local se depararam com suspeitos, que estavam aglomerados. Que fizeram uma busca pessoal, onde encontraram drogas com os suspeitos. Que os suspeitos assumiram ser de propriedade deles as drogas. Que não se recorda se os suspeitos disseram se as drogas eram para uso próprio. Que não era uma quantidade considerada (...)”.

No mesmo sentido, o também policial militar, Jairo Gomes Ribeiro, disse o seguinte  em juízo: “(...) Que se recorda dos fatos. Que estavam em patrulhamento nas avenidas do setor planalto. Que pessoas os abordaram e relataram. Que tem um ponto antigo nessa avenida comumente chamado de ponto e venda de entorpecentes. Que foram ao local. Que encontraram dois indivíduos na frente do local. Que os abordaram e encontraram uma porção de material semelhante à maconha (...)”.

Por sua vez, utilizando seu direito constitucional ao silêncio, optou o processado pelo não compareceu em juízo.

Muito bem, verifica-se que a prova oral colhida demonstra, com um alto grau de probabilidade, a prática pelo processado do fato descrito na exordial acusatória.

Com efeito, os policiais militares Jadivan de Souza Costa, Rafael Pereira Rocha e Jairo Gomes Ribeiro afirmaram que estavam em patrulhamento no setor Novo Plantalto, nesta cidade, oportunidade em que populares disseram que próximo dali havia um ponto de venda e consumo de drogas.

Os castrenses se deslocaram ao mencionado local e depararam com o processado José Bonfim e o codenunciado em via pública, em frente à localizada indicada.

Foi realizada a abordagem no processado José Bonfim, sendo encontrado material entorpecente com este, em pequena quantidade, o qual foi posteriormente conduzido até a Delegacia de Polícia, confessando a propriedade da droga.

Assim, as provas existentes no processo levam ao entendimento de que a droga apreendida foi encontrada com o processado José Bonfim Ribeiro Carvalho.

No tocante ao juízo de adequação da conduta do processado José Bonfim Ribeiro Carvalho, percebe-se que a defesa técnica, em suas alegações finais, solicitou um enquadramento típico da conduta imputada aquele diferente do que foi formulado na inicial.

Para a defesa técnica deve ocorrer à desclassificação do crime descrito na inicial para de consumo pessoal.

Segundo a defesa técnica, foi apreendida pequena quantidade de maconha, aproximadamente 23gramas e conforme informação do processado a droga se destinava a consumo próprio.

Ademais, asseverou a defesa técnica que não existe comprovação nos autos que o processado José Bonfim responda outras ações relacionadas ao trafico de drogas, não existe qualquer comprovação que pertença a facções criminosas, especialmente voltadas para a traficância.

Ressaltou ainda que os policiais ouvidos em audiência judicial disseram que não conheciam o processado, ou seja, não demonstrando que o mesmo era dado ao trafico de drogas;

Com efeito, nota-se que assiste razão à defesa técnica haja vista que, no que se refere, especificamente, à tipicidade formal, existe uma dúvida razoável da existência do crime de tráfico de drogas.

Ora, não existem elementos claros no processo do fim de circulação da droga encontrada na posse do processado e da processada.

Nenhuma testemunha declarou que a droga apreendida seria para a venda. Também não existe nenhum elemento concreto que demonstre a intenção de circulação da droga encontrada com o processado.

Muito bem. A Constituição Federal de 1988 e a Convenção Americana de Direitos Humanos preconizam o princípio da presunção de inocência.

Diante disto, a única presunção que se admite no processo penal é a de inocência.

Além do mais, decorre do referido princípio a regra probatória de que   não cabe à defesa técnica comprovar que a droga encontrada com o processado era destinada ao comércio, mas, sim, a acusação demonstrar, com provas robustas, a existência do tráfico.

Também como corolário do mencionado princípio constitucional e convencional, tem-se o in dubio pro reo. Isto leva ao entendimento de que, no caso de dúvida razoável, a questão deve ser resolvida a favor do processado.

Na situação em análise, diante da dúvida razoável, por inoperância do Estado em demonstrar a traficância, o fato comprovado no processo se amolda ao tipo descrito no artigo 28, da Lei 11343/2006.

Logo, as provas carreadas  ao processo não levam à alta probabilidade de que a substância entorpecente encontrada  em poder do processado era para a comercialização.

Reitere-se que cabe ao Órgão Acusador demonstrar a traficância, ou seja, comprovar, sem dúvida razoável, que o processado trazia consigo drogas para a comercialização.

No caso em apreço, há uma dúvida razoável,  no sentido  de que o processado trazia consigo drogas para difundi-las a título oneroso ou gratuito.

No que toca à prova oral, em que pese o processado não ter sido ouvido, em juízo, os policiais militares inquiridos não informaram, com alta probabilidade, se a droga encontrada com o processado era para a comercialização.

Observa-se, também, que não há nenhuma testemunha que tenha presenciado o processado vendendo, oferecendo ou, por qualquer outra conduta, traficando drogas, sendo certa apenas a posse da droga, a qual pode configurar tanto o uso quanto o tráfico, tal circunstância, por si só, não evidencia a prática do crime de tráfico.

 Além do mais, o processado não estava com balança, anotações, artefatos ou uma grande quantidade de substâncias entorpecentes, que pudesse demonstrar que os mesmos exerciam atos de comercialização das referidas substâncias, o que pode denotar, pelas demais provas carreadas aos autos, que as citadas eram para o próprio uso dos processados.

Aliás, os próprios policiais militares relataram que era pequena a quantidade de droga que o processado José Joaquim Ribeiro Carvalho trazia consigo.

Portanto, a intenção de comercialização da droga, por parte do processado não ficou caracterizada, seja em razão dos depoimentos dos policiais militares ouvidos em audiência judicial, seja, em razão de não ter sido encontrado objetos indicativos de traficância.

Com efeito, havendo dúvida fundada sobre se trata de tráfico ou porte para consumo, cabe reconhecer, no caso específico, o princípio do “in dubio pro reo” derivado do princípio da presunção de inocência.

Assim, no caso em apreço, há uma dúvida clara a respeito da comercialização da droga apreendida por parte dos processados.

Ressalte-se que não se pode condenar, devido ao princípio constitucional ou convencional da presunção de inocência, com base em presunções, ilações ou hipóteses.

Convém ressaltar, não há no processo elementos de provas diretos, produzidos sob o crivo do contraditório, que possam comprovar, com alta probabilidade, que o processado trazia consigo substâncias entorpecentes com a intenção de comercializá-las.

Com efeito, não exsurge, pelas provas produzidas, a destinação comercial da droga apreendida.

É que, levando em consideração os parâmetros previstos no artigo 28, §2º, da Lei 11.343/06, para se analisar a destinação da droga, percebe-se que, a par da quantidade de entorpecentes, que não é ínfima, mas também não se pode reputá-la considerável, nenhum outro elemento vem a socorrer a tese da mercancia.

Assim, as circunstâncias do crime e a quantidade da droga apreendida não evidenciaram a traficância.

 No mais, os policiais militares não souberam informar se o processado teria ou não praticado atividade relativa ao comércio da droga apreendida.

Ao teor do exposto, tem-se, como única conclusão lógica extraída das provas existentes no processo, a desclassificação do crime descrito na denúncia (tráfico de drogas) para o crime descrito no artigo 28, caput da Lei 11343/2006 (uso de substância tóxica).

[...]

Ante o fato de o apelante não ser reincidente em tráfico, a pequena quantidade de drogas apreendia, e tendo em vista que nenhum Policial viu o apelante comercializando drogas, entendo que a desclassificação deve ser mantida. Nos termos do artigo 28, § 2º, da Lei de Drogas, para determinar se a droga destinava-se a consumo pessoal, o juiz atenderá à natureza e à quantidade da substância apreendida, ao local e às condições em que se desenvolveu a ação, às circunstâncias sociais e pessoais, bem como à conduta e aos antecedentes do agente. No mesmo sentido a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:

PENAL E PROCESSO PENAL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. JUSTIÇA FEDERAL X JUIZADO ESPECIAL CRIMINAL ESTADUAL. AÇÃO PENAL. DECLINAÇÃO DE COMPETÊNCIA FUNDADA EM DESCLASSIFICAÇÃO DO DELITO DE TRÁFICO INTERNACIONAL DE ENTORPECENTES PARA O DELITO DE POSSE DE DROGA PARA CONSUMO PRÓPRIO. CONDUTA QUE SE AMOLDA À POSSE DE DROGAS PARA USO PRÓPRIO. DELITO DE MENOR POTENCIAL OFENSIVO. COMPETÊNCIA DO JUIZADO ESPECIAL. 1. O crime de uso de entorpecente para consumo próprio, previsto no art. 28 da Lei 11.343/06, é de menor potencial ofensivo, o que determina a competência do Juizado Especial estadual, já que ele não está previsto em tratado internacional e o art. 70 da Lei n. 11.343/2006 não o inclui dentre os que devem ser julgados pela Justiça Federal. 2. Ao qualificar uma conduta como"porte de drogas para consumo pessoal", o magistrado deve orientar-se pelos parâmetros objetivos e subjetivos definidos no § 2º do art. 28 da Lei 11.343/2006, que determina o exame da quantidade e natureza da droga, seu destino, o local e condições em que se desenvolveu a ação, assim como as circunstâncias sociais e pessoais, além da conduta e dos antecedentes do agente . 3. A mera potencialidade de refinamento de matéria prima da droga não induz, necessariamente, à conclusão de que a intenção daquele que a porta é refiná-la, com vistas à sua comercialização, máxime quando desacompanhada de indícios de que o portador possua apetrechos e/ou conhecimentos que lhe permitam fazê-lo, nem tampouco indícios de conexão com outro (s) traficante (s) ou mesmo de atividades suspeitas que sinalizem a obtenção de renda sem fonte lícita. 4. Situação em que o réu foi surpreendido, no dia 16/08/2014, durante fiscalização de rotina da Receita Federal em Posto de Estra, próximo à fronteira Brasil/Bolívia, trazendo consigo 185 (cento e oitenta e cinco) gramas de cocaína, na forma de pastabase, adquirida na Bolívia. 5. A pequena quantidade de entorpecente apreendida em poder do réu, somada à sua confissão de dependência química e à existência de um único antecedente penal ocorrido há mais de 10 (dez) anos relacionado ao tráfico, sem nenhuma evidência recente de relacionamento com traficantes, ou mesmo de atividades suspeitas que indiquem a obtenção de renda sem fonte lícita, demonstram estar correto o Juízo suscitado (da Justiça Federal) quando afirmou não existirem, nos autos, elementos aptos a sustentar a tipificação do art. 33 c/c 40, I e III, da Lei 11.343/2006, merecendo a conduta descrita na denúncia ser desclassificada e reenquadrada no tipo penal do art. 28 da Lei 11.343/2006 . 6. Conflito conhecido, para declarar competente para o julgamento da ação penal o Juízo de Direito do Juizado Especial Cível e Criminal de Corumbá/MS, o suscitante. (STJ. CC 144.910/MS, Rel. Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 13/04/2016, DJe 25/04/2016).

No delito de tráfico, a existência de meros indícios não autoriza o decreto condenatório, devendo estar comprovada, de forma segura e firme, a traficância exercida pelo acusado, em observância ao princípio in dubio pro reo. Não havendo provas de que a droga apreendida em poder do réu se destinava à comercialização e se as circunstâncias indicam que a substância se destinava ao seu próprio consumo, impõe-se a desclassificação do delito de tráfico para o de uso de substância entorpecente, como realizado pelo magistrado de origem.

ANTE O EXPOSTO, voto no sentido de CONHECER do recurso e, no mérito, NEGAR-LHE PROVIMENTO.  



Documento eletrônico assinado por PEDRO NELSON DE MIRANDA COUTINHO, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Instrução Normativa nº 5, de 24 de outubro de 2011. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.tjto.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 840084v2 e do código CRC 284cf53f.

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Documento:840085
Poder Judiciário
JUSTIÇA ESTADUAL
Tribunal de Justiça do Estado do Tocantins
GAB. DO DES. PEDRO NELSON DE MIRANDA COUTINHO

Apelação Criminal (PROCESSO ORIGINÁRIO EM MEIO ELETRÔNICO) Nº 0001884-42.2021.8.27.2737/TO

RELATOR: Desembargador PEDRO NELSON DE MIRANDA COUTINHO

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO (AUTOR)

APELADO: JOSE BONFIM RIBEIRO CARVALHO (RÉU)

ADVOGADO(A): ESTELAMARIS POSTAL (DPE)

PENAL E PROCESSUAL PENAL. APELAÇÃO CRIMINAL. TRÁFICO DE ENTORPECENTES. SENTENÇA PROCEDEU A DESCLASSIFICAÇÃO PARA O CRIME DE USO. RECURSO MINISTERIAL. AUSÊNCIA DE PROVA SEGURA DO SUPOSTO ENVOLVIMENTO DO RÉU NO TRÁFICO DE DROGAS. PEQUENA QUANTIDADE DE DROGA. DEPOIMENTOS DOS POLICIAIS NÃO FORAM CONCLUSIVOS. ENVOLVIMENTO COM FACÕES NÃO CONSTATADO. SENTENÇA MANTIDA. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO.

1. Ante o fato de o apelante não ser reincidente em tráfico, a pequena quantidade de drogas apreendia e tendo em vista que nenhum Policial viu o apelante comercializando drogas, verifica-se que a desclassificação deve ser mantida.

2. No delito de tráfico, a existência de meros indícios não autoriza o decreto condenatório, devendo estar comprovada, de forma segura e firme, a traficância exercida pelo acusado, em observância ao princípio in dubio pro reo. Não havendo provas de que a droga apreendida em poder do réu se destinava à comercialização e se as circunstâncias indicam que a substância se destinava ao seu próprio consumo, impõe-se a desclassificação do delito de tráfico para o de uso de substância entorpecente, como realizado pelo magistrado de origem.

3. Recurso conhecido e não provido.

ACÓRDÃO

A  Egrégia 2ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Estado do Tocantins decidiu, por unanimidade, CONHECER do recurso e, no mérito, NEGAR-LHE PROVIMENTO, nos termos do voto do(a) Relator(a).

PROCURADORA  LEILA DA COSTA VILELA MAGALHÃES

Palmas, 08 de agosto de 2023.



Documento eletrônico assinado por PEDRO NELSON DE MIRANDA COUTINHO, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Instrução Normativa nº 5, de 24 de outubro de 2011. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.tjto.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 840085v4 e do código CRC f6307029.

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Data e Hora: 4/9/2023, às 14:10:29

 


 


Documento:840083
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Tribunal de Justiça do Estado do Tocantins
GAB. DO DES. PEDRO NELSON DE MIRANDA COUTINHO

Apelação Criminal (PROCESSO ORIGINÁRIO EM MEIO ELETRÔNICO) Nº 0001884-42.2021.8.27.2737/TO

RELATOR: Desembargador PEDRO NELSON DE MIRANDA COUTINHO

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO (AUTOR)

APELADO: JOSE BONFIM RIBEIRO CARVALHO (RÉU)

ADVOGADO(A): ESTELAMARIS POSTAL (DPE)

RELATÓRIO

Trata-se de recurso de APELAÇÃO CRIMINAL interposto pelo MINISTÉRIO PÚBLICO (interposição no evento 84 e razões no evento 92, ambos da ação originária) contra sentença proferida pelo JUÍZO DA 1ª VARA CRIMINAL DE PORTO NACIONAL no evento 78 da AÇÃO PENAL N. 00018844220218272737, tendo como apelado JOSE BONFIM RIBEIRO CARVALHO (contrarrazões no evento 95 do processo originário).

O recorrido JOSE BONFIM RIBEIRO CARVALHO teve sua conduta desclassificada do artigo 33 da Lei n. 11.343/06 (tráfico de drogas), como exposto na denúncia, para o crime do artigo 28 da Lei n. 11.343/06 (uso próprio), com a consequente remessa dos autos ao Juizado Especial Criminal.

A decisão recorrida fundamentou que policiais militares estavam em patrulhamento, oportunidade em que “populares” repassaram a informação indicando um ponto de venda e consumo de drogas. Ao chegarem na localidade, encontraram o recorrido e outro indivíduo (também denunciado cuja ação foi desmembrada). Ao procederem a busca pessoal, encontraram aproximadamente 23,1 gramas de maconha e a quantia de R$88,00. Parte da substância estava dividida (15,20g), o restante em uma única porção (8,20g). Entretanto, o magistrado de primeira instância constatou que nenhum dos policiais presenciou as condutas de traficância, ouviu os réus confessarem a traficância ou mesmo conheciam os réus como traficantes da região.

Pelo contrário, segundo as testemunhas, os presos afirmaram que a droga era destinada ao uso. Além disso, o recorrido: é primário; não respondia a outros processos; não tinha envolvimento com facção criminosa; não estava com balança, anotações, artefatos ou uma grande quantidade de substâncias entorpecentes. Diante disso o sentenciante concluiu que há uma dúvida clara a respeito da comercialização da droga apreendida e, por isso, desclassificou a conduta. 

Em sua impugnação, o apelante pleiteia a condenação nos termos da denúncia.

Contrarrazões pelo não provimento do recurso.

Com vista, o Órgão de Cúpula Ministerial emitiu parecer em 07/07/2023, evento 09, manifestando-se pelo conhecimento e provimento do recurso.

É o relatório. Ao revisor.



Documento eletrônico assinado por PEDRO NELSON DE MIRANDA COUTINHO, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Instrução Normativa nº 5, de 24 de outubro de 2011. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.tjto.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 840083v2 e do código CRC c3287978.

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Extrato de Ata
Poder Judiciário
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EXTRATO DE ATA DA SESSÃO ORDINÁRIA DE 01/08/2023

Apelação Criminal (PROCESSO ORIGINÁRIO EM MEIO ELETRÔNICO) Nº 0001884-42.2021.8.27.2737/TO

RELATOR: Desembargador PEDRO NELSON DE MIRANDA COUTINHO

REVISORA: Desembargadora ANGELA ISSA HAONAT

PRESIDENTE: Desembargador PEDRO NELSON DE MIRANDA COUTINHO

PROCURADOR(A): LEILA DA COSTA VILELA MAGALHÃES

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO (AUTOR)

APELADO: JOSE BONFIM RIBEIRO CARVALHO (RÉU)

ADVOGADO(A): ESTELAMARIS POSTAL (DPE)

Certifico que a 2ª CÂMARA CRIMINAL, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

APÓS O VOTO DO DESEMBARGADOR PEDRO NELSON DE MIRANDA COUTINHO NO SENTIDO DE CONHECER DO RECURSO E, NO MÉRITO, NEGAR-LHE PROVIMENTO, NO QUE FOI ACOMPANHADO PELA DESEMBARGADORA ANGELA ISSA HAONAT, PEDIU VISTA A DESEMBARGADORA JACQUELINE ADORNO DE LA CRUZ BARBOSA.

Votante: Desembargador PEDRO NELSON DE MIRANDA COUTINHO

Votante: Desembargadora ANGELA ISSA HAONAT

Pedido Vista: Desembargadora JACQUELINE ADORNO DE LA CRUZ BARBOSA

MARIA SUELI DE SOUZA AMARAL CURY

Secretária


Extrato de Ata
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Tocantins

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO ORDINÁRIA DE 08/08/2023

Apelação Criminal (PROCESSO ORIGINÁRIO EM MEIO ELETRÔNICO) Nº 0001884-42.2021.8.27.2737/TO

RELATOR: Desembargador PEDRO NELSON DE MIRANDA COUTINHO

REVISORA: Desembargadora ANGELA ISSA HAONAT

PROCURADOR(A): LEILA DA COSTA VILELA MAGALHÃES

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO (AUTOR)

APELADO: JOSE BONFIM RIBEIRO CARVALHO (RÉU)

ADVOGADO(A): ESTELAMARIS POSTAL (DPE)

Certifico que a 2ª CÂMARA CRIMINAL, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

PROSSEGUINDO NO JULGAMENTO, APÓS O VOTO-VISTA DA DESEMBARGADORA JACQUELINE ADORNO DE LA CRUZ BARBOSA ACOMPANHANDO O RELATOR, A 4ª TURMA JULGADORA DA 2ª CÂMARA CRIMINAL DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER DO RECURSO E, NO MÉRITO, NEGAR-LHE PROVIMENTO.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador PEDRO NELSON DE MIRANDA COUTINHO

Votante: Desembargadora JACQUELINE ADORNO DE LA CRUZ BARBOSA

MARIA SUELI DE SOUZA AMARAL CURY

Secretária