Documento:513748
Poder Judiciário
JUSTIÇA ESTADUAL
Tribunal de Justiça do Estado do Tocantins
GAB. DO DES. RONALDO EURIPEDES

Apelação/Remessa Necessária Nº 0033750-29.2020.8.27.2729/TO

PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 0033750-29.2020.8.27.2729/TO

RELATOR: Juiz JOCY GOMES DE ALMEIDA

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO (AUTOR)

APELADO: MUNICIPIO DE PALMAS (RÉU)

INTERESSADO: Autoridade Coatora - TRIBUNAL DE JUSTICA DO ESTADO DO TOCANTINS - Palmas

VOTO

Ab initio, é patente a possibilidade de utilização da lei de regência da Ação Popular (Lei 4.717/1965) como fonte do microssistema processual de tutela coletiva, prevalecendo, inclusive, sobre disposições gerais do Código de Processo Civil. Por aplicação analógica da primeira parte do art. 19 da Lei 4.717/1965, as sentenças de improcedência de Ação Civil Pública sujeitam-se, indistintamente, ao reexame necessário (REsp 1.108.542/SC, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, DJe 29/5/2009).

A sentença de improcedência da Ação Civil Pública se sujeita a REEXAME NECESSÁRIO (STJ - AgInt no AREsp 1008646/MG, Rel. Ministro FRANCISCO FALCÃO, SEGUNDA TURMA, julgado em 19/06/2018, DJe 22/06/2018), o que enseja o CONHECIMENTO.

Por sua vez, os pressupostos processuais em relação ao recurso do Ministério Público foram atendidos; utilizado o recurso cabível; há interesse e legitimidade para recorrer; este é tempestivo e os preparo dispensado. Inexistindo fato impeditivo do direito recursal noticiado nos autos, assim, verificado os pressupostos legais, CONHEÇO do recurso intentado para a análise das questões de fundo suscitadas.

Conforme relatado, pretende o Apelante MINISTÉRIO PÚBLICO reformar a sentença proferida pelo Juízo da Vara de Execuções Fiscais e Saúde da Comarca de Palmas – TO que, nos autos da Ação Civil Pública nº 00337502920208272729, ajuizada pelo insurgente em desfavor do MUNICÍPIO DE PALMAS rejeitou os pedidos formulados na inicial, por entender que o controle jurisdicional sobre os atos administrativos é reservado para situações de excepcionalidade e urgência, com vistas a evitar lesão à ordem pública, saúde e economia pública, sendo que a ausência de ilegalidade ou omissão na organização e coordenação do combate à crise epidemiológica, não induz a abertura de espaço para interferência do Judiciário, cuja atividade funcional se reserva apenas para circunstâncias excepcionais, de forma a não conflagrar interferência entre os poderes..

Relata que o Ministério Público objetiva provimento jurisdicional com vistas a compelir o Município de Palmas na prestação de fazer, consistente em corrigir as irregularidades evidenciadas pelo Conselho Regional de Medicina do Estado do Tocantins, que ensejou a instauração dos Procedimentos Preparatórios 2020.0004327 e 2020.0003536, bem como as Notícias de Fato nº 2020.0003534, 2020.0003533 e 2020.0003932 e irregularidades detectadas pelo Conselho Municipal de Saúde na UPA SUL, com o fim de garantir a prestação do serviço público de realização de exames em pacientes com suspeita de COVID 19, bem como o fornecimento de medicamentos necessário ao tratamento.

Aduz o Ministério Público Apelante que o Ofício nº 2467/2020 de 29 de setembro de 2020 (Evento 20), apresentado pelo Apelado, documento este que o D. Magistrado utiliza para firmar seu convencimento no cumprimento das irregularidades, não é suficiente para tanto, uma vez que o Apelante peticionou diversas outras vezes nos autos a fim de demonstrar as irregularidades e descumprimento da liminar pelo Município de Palmas, muito embora na decisão o D. Julgador manifeste suficiente a resposta apresentada pelo Município de Palmas, faz-se necessário esclarecer que no Memorando nº 1500/2020 (Evento 26 – ANEXO9) menciona que o cidadão foi consultado no dia 04/08/2020 e realizado o teste apenas no dia 19/08/2020, ou seja, passado prazo necessário para realização do mesmo, demonstrando as irregularidades nas testagens realizadas pelo Apelado.

Alega que no Relatório de vistoria DEFISC nº 241/2017 – Demanda nº 441/2020/TO, em vistoria do CRM realizada no dia 05/06/2020 no Centro de Saúde da Comunidade Laurides Lima Milhomem (Evento 26 – ANEXO11), foi constatado irregularidades no fluxo de atendimento de UBS – UPA, manifestando conflito quanto ao atendimento dos pacientes, não sendo realizado na unidade de saúde agendamento para teste de Covid-19, bem como não disponibilizando treinamentos/informações com equipe multiprofissional para enfrentamento do Covid-19e, da mesma forma, no 3º Relatório do Processo 317/2018/TO – Demanda nº 343/2020/TO, foi averiguado pelo CRM no Centro de Saúde da Comunidade Liberdade em vistoria realizada em 12/08/2020 (Evento 26 – ANEXO12) irregularidades em não dispor de equipe de profissionais especificamente designados para o atendimento com suspeita Covid-19, em desconformidade com a Nota Técnica GVIMS/GGTES/ANVISA Nº 04/2020.

Afirma que durante todo o trâmite processual restou devidamente comprovada as irregularidades quanto ao fluxo de atendimento aos pacientes Covid-19, triagem, segurança dos protocolos de atendimento e a regularização dos exames relativos ao diagnóstico da doença (testagem) por parte do Município de Palmas, sendo contraditória a r. sentença que julgou pela improcedência da ação civil pública, sendo que no decorrer de todo o processo judicial o MM. Juiz a quo proferiu decisões atendendo as pretensões do Ministério Público para regularizar o atendimento aos usuários nas unidades de saúde do Município de Palmas, visando o atendimento eficaz e seguro aos pacientes com Covid-19 ou suspeita, evitando maior contágio e proliferação do vírus, com uma testagem eficiente, a fim de permitir um rápido diagnósticos e tratamento, desta forma, diante da contrariedade da sentença diante das provas documentais juntadas aos autos, faz-se imprescindível que o E. Tribunal de Justiça proceda com a reforma da decisão de piso, julgando a Ação Civil Pública procedente nos termos requeridos na inicial.

Assevera que as supostas regularizações das pendências somente foram realizadas após o deferimento do pedido de tutela provisória de urgência (evento 12), o que corroborou a necessidade de ingressar com a presente medida judicial, ademais, houve, portanto, o mero cumprimento da decisão que deferiu a tutela provisória de urgência, o que não esgota o interesse do Ministério Público em ver o direito dos usuários assegurados pelo julgamento definitivo da demanda e acobertado pela coisa julgada material.

Requer o conhecimento e o provimento do presente recurso de apelação, com a consequente reforma da sentença recorrida, a fim de julgar totalmente procedente a Ação Civil Pública originária.

Intimado, o apelado Município de Palmas apresentou contrarrazões ao recurso – evento 166 – origem, pugnando pelo improvimento do apelo, sendo mantida a sentença proferida pelo douto julgador monocrático em todos os seus termos.

Instado a se manifestar, o Procurador de Justiça de Cúpula, no parecer constante do evento 10, manifestou-se pelo conhecimento e provimento da Apelação Cível, a fim de que sejam julgados procedentes os pedidos deduzidos na ação civil pública originária.

Mérito.

Com efeito, o presente caso trata-se da responsabilidade do Município de Palmas promover a regularização do serviço de fornecimento de medicamento, aparelhamento e testagem, com a correção das irregularidades apontada pelo Conselho Regional de Medicina nos Procedimentos Preparatórios 2020.0004327 e 2020.0003536 referente às Unidades de Pronto Atendimento UPA SUL e UPA NORTE de Palmas/TO, bem como as Notícias de Fato nº 2020.0003534, 2020.0003533 e 2020.0003932 e irregularidades detectadas pelo Conselho Municipal de Saúde na UPA SUL, com o fim de garantir a prestação do serviço público de realização de exames em pacientes com suspeita de COVID 19, bem como o fornecimento de medicamentos necessário ao tratamento.

Extrai-se dos autos que restou comprovada irregularidades relativas ao protocolo de atendimento de pacientes COVID-19, dentre as quais o Autor Ministerial destacou: a falta de materiais, exames e testes, ausência de fluxo regulador e deficiência na escala de profissionais de saúde, cujos pedidos restaram assim formulados:

"1. concessão de medida liminar para que o ente municipal regularize no prazo de 24 horas a testagem RÁPIDA e SOROLÓGICA de pacientes suspeitos de COVID 19 nas Unidades de Saúde referenciadas do SUS da capital; 2. Informe no prazo de 3 (três) dias: a) a quantidade de testes rápidos e sorológicos disponíveis; b) o protocolo adotado para testagem nas unidades de saúde de referência; e c) Estoque de medicamento e insumos utilizados no combate a COVID 19; 2) Para logo em seguida, regularizar, com a máxima urgência, as irregularidades apontadas pelo Conselho Regional de Medicina; 3) Regularizar e manter o estoque de medicamento na Unidade de Pronto Atendimento Sul, em especial, Azitromicina, Hidroxicloroquina e Hidralazina; 4) Regularizar as escalas dos profissionais de saúde na UPA Sul, a fim de evitar a descontinuidade na prestação de serviço à saúde. 5) sanar as irregularidades na Recepção da UPA SUL, quanto à disponibilidade de informações visíveis sobre a profilaxia da COVID 19, estabelecer o distanciamento dos usuários, controlar o fluxo de entrada e saída, a fim de evitar aglomerações; 6) Disponibilizar a realização do teste da COVID 19 aos usuários e profissionais da saúde, conforme orientação estabelecida pela Organização Mundial de Saúde e do Ministério da Saúde; 7) suprir a falta de equipamento na UPA SUL como esfigmomanômetros, oxímetros, circuito de respiradores e Eletrocardiograma; 8) realizar manutenção dos equipamentos sem funcionamento, como no caso do o monitor de triagem TRUS da UPA SUL; 9) Implementar os protocolos estabelecidos para o enfrentamento da pandemia causada pelo COVID 19, dentre os quais, o protocolo de Manchester que estabelece um plano de capacitação dos servidores e o Plano de Contingência Palmas COVID 19, versão 7.0 de 05/05/2020 que estabelece o fluxo rápido para paciente dentro da unidade de urgência e a gestão de Enfermagem na UPA SUL 10) disponibilizar de forma imediata os EPIs para os profissionais da saúde que laboram na UPA SUL em especial na Ala da COVID; 11) seja fixada, já na concessão da tutela antecipada, multa diária à base de R$ 100. 000, 00 ( cem mil reais), em caso de descumprimento da medida judicial determinada, em desfavor do agente político responsável pelo cumprimento da decisão; (...)".

Destarte, foi proferida decisão, DEFERINDO parcialmente o pedido de tutela provisória de urgência – evento 12 – origem:

Veja-se que a sentença entendeu pela improcedência da ação, acolhendo a alegação de cumprimento das irregularidades pelo Município de Palmas peticionado no Evento 20 – origem:

Ocorre que a suposta regularização das pendências somente foram realizadas APÓS O DEFERIMENTO DO PEDIDO DE TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA (evento 12 – origem), o que corroborou a necessidade de ingressar com a presente medida judicial, houve, portanto, o mero cumprimento da decisão que deferiu a tutela provisória de urgência, o que não esgota o interesse do Ministério Público em ver o direito dos usuários assegurados pelo julgamento definitivo da demanda e acobertado pela coisa julgada material.

O cumprimento da obrigação ocorrido em virtude de ordem liminar não implica em desaparecimento da pretensão à tutela jurídica e ao provimento de mérito, nos termos do que disciplina o artigo 296, do CPC.

A propósito, da necessidade da sentença a confirmar eventuais liminares, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça:

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. TRANSFERÊNCIA HOSPITALAR. TRATAMENTO DE SAÚDE. LIMINAR SATISFATIVA. PERDA DO OBJETO DA AÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. PRECEDENTES. SÚMULA 83/STJ. FUNDAMENTO CONSTITUCIONAL DO ACÓRDÃO RECORRIDO. SÚMULA 126/STJ. REVOLVIMENTO DE FATOS E PROVAS. SÚMULA 7/STJ. Trata-se de Recurso Especial que busca declarar a perda de objeto da presente ação em razão do cumprimento de liminar que, segundo afirma o recorrente, assegurou a transferência da parte recorrida a hospital para tratamento médico. (...). O entendimento do STJ está firmado no sentido de que o simples fato do cumprimento da ordem em antecipação de tutela não implica a perda do objeto da demanda ou a falta de interesse processual, sendo necessário o julgamento do mérito da causa, para definir se a parte beneficiada, de fato, fazia jus a tal pretensão. Precedentes: AgRg no REsp 1.353.998/RS, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 10/3/2015, DJe 13/3/2015; AgInt no AREsp 1.065.109/MG, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 5/10/2017, DJe 23/10/2017. (...). (STJ - REsp 1689991/MG, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN - DJe 25/05/2018).

PROCESSUAL CIVIL. ADMINISTRATIVO. TRATAMENTO DE SAÚDE. TRANSFERÊNCIA DE HOSPITAL. LIMINAR SATISFATIVA. PERDA DE OBJETO. NÃO OCORRÊNCIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. REVISÃO. REEXAME DE MATÉRIA FÁTICA. IMPOSSIBILIDADE. ÓBICE DA SÚMULA 7/STJ. 1. O acórdão recorrido encontra-se em consonância com o entendimento consolidado desta Corte Superior no sentido de que a concessão da tutela antecipada para garantir a transferência da recorrida para hospital especializado ao seu tratamento não retira o interesse de agir da parte, nem impõe a conseguinte extinção terminativa do feito por perda de objeto. Precedentes da Corte. 2. (...). 3. (...). 4. (...). (STJ - AgInt no AREsp 1065109/MG, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA - DJe 23/10/2017)

No mesmo sentido, já decidiu este Tribunal:

REMESSA NECESSÁRIA. INTERPOSIÇÃO DE APELO VOLUNTÁRIO PELA FAZENDA PÚBLICA. ART. 496, § 1º DO CPC. PREJUDICIALIDADE. REMESSA NECESSÁRIA NÃO CONHECIDA. 1 - Interposta apelação voluntária, a remessa necessária não deve ser conhecida, nos termos do art. 496, § 1º do CPC. 2 - Remessa Necessária Não Conhecida. APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER. ALEGAÇÃO DE PERDA DO OBJETO. CUMPRIMENTO DA TUTELA ANTECIPADA. INEXISTÊNCIA DE EXAURIMENTO DO OBJETO DA AÇÃO. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. DEFENSORIA PÚBLICA. MESMA PESSOA JURÍDICA. IMPOSSIBILIDADE DE FIXAÇÃO. SÚMULA 421 DO STJ. APELO PARCIALMENTE PROVIDO. 3 - O mero cumprimento do que foi definido em tutela antecipada ou mesmo em sentença não tem o condão de provocar a perda do objeto da ação, considerando que além da pretensão propriamente dita, a parte pretende a declaração judicial de seu direito, mesmo quando o réu cumpre espontaneamente a obrigação ou reconhece o pedido, cabe ao magistrado proferir sentença de mérito. 4 - Quando a Defensoria Pública atua contra a pessoa jurídica a que pertence, é indevida a fixação de honorários de sucumbência. Súmula 421 do STJ. 5 - Apelo Parcialmente Provido. (TJTO – AP 0006611-12.2019.827.0000 – Rel. Desa. Maysa Vendramini Rosal – j. 15/05/2019)

APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO CÍVIL PÚBLICA. EXTINÇÃO SEM RESOLUÇÃO DE MÉRITO. EXAURIMENTO DO PEDIDO ANTE O CUMPRIMENTO DA MEDIDA LIMINAR DEFERIDA E A CONSEQUENTE CARÊNCIA DA AÇÃO PELA FALTA DO INTERESSE JURÍDICO DE AGIR. NÃO OCORRÊNCIA. PRECEDENTES DO C. STJ. SENTENÇA ANULADA. ART. 1.013, § 3º, I, CPC. APLICABILIDADE. MÉRITO. FORNECIMENTO DE CONSULTA MÉDICA. DIREITO À SAÚDE. CONFIRMAÇÃO DA LIMINAR. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO. 1) Com o devido cumprimento da liminar satisfativa, mesmo estando patente o alcance da pretensão inicial, é certo que o julgamento do processo, com análise do próprio mérito, deve ocorrer. Possíveis afastamentos do direito rogado em favor da paciente conduziriam a atos outros, dessa vez, com o propósito do ressarcimento do Poder Público pelas despesas suportadas, em razão da aludida consulta. Logo, não há de se falar em exaurimento do pedido ante o cumprimento da medida liminar deferida e a consequente carência da ação pela falta do interesse jurídico de agir. 2) \"O entendimento do STJ está firmado no sentido de que o simples fato do cumprimento da ordem em antecipação de tutela não implica a perda do objeto da demanda ou a falta de interesse processual, sendo necessário o julgamento do mérito da causa, para definir se a parte beneficiada, de fato, fazia jus a tal pretensão. Precedentes: AgRg no REsp 1.353.998/RS, Rel. Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, julgado em 10/3/2015, DJe 13/3/2015; AgInt no AREsp 1.065.109/MG, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, julgado em 5/10/2017, DJe 23/10/2017\". 3) Nos termos do art. 196 da Constituição da República, a saúde é direito de todos e dever do Estado. Essa premissa impõe ao Estado, entendendo-se este em todos os seus níveis - federal, estadual e municipal, ante a solidariedade dos entes da federação no financiamento do Sistema Único de Saúde - o dever de providenciar as medidas necessárias à preservação da saúde de quem necessitar. 4) Recurso conhecido e provido. 5) Sentença cassada. (TJTO - AP 0028326-16.2018.827.2700 – Rel. Juiz Gilson Coelho Valadares – j. 13/02/2019).

EMENTA: APELAÇÕES CÍVEIS. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CUMPRIMENTO DE LIMINAR SATISFATIVA. PERDA DO OBJETO. IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES. RECURSOS CONHECIDOS E IMPROVIDOS. 1- Em se tratando de obrigação de fazer em ação civil pública com escopo de obrigar, solidariamente, o Estado e o Município de construir ponte, não há que se falar em perda do objeto pelo cumprimento de liminar satisfativa, diante da necessidade de resolução do mérito da ação, sendo necessário, pois, a confirmação da tutela outrora deferida. 2- Precedentes. 3- Provimento negado. (Apelação Cível 0023083-57.2019.8.27.0000, Rel. JOSÉ RIBAMAR MENDES JÚNIOR, GAB. DO JUIZ CONVOCADO JOSÉ RIBAMAR MENDES JÚNIOR, julgado em 11/03/2020, DJe 23/03/2020 17:13:43)

Repisa-se que a suposta regularização das falhas apontadas pelo Município de Palmas somente se deu após o deferimento do pedido de tutela provisória de urgência, o que não rechaça a necessidade de a matéria ser acobertada pela coisa julgada material, a fim de garantir, em definitivo, o direito dos usuários do Sistema Único de Saúde.

Ademais, como visto, a antecipação dos efeitos da tutela não exaure o objeto da demanda, porquanto apenas antecipa a tutela jurisdicional, como se extrai da própria expressão, que oportunamente deverá ser confirmada, ou não, por sentença, subsistindo, portanto, o interesse processual da parte.

O expediente utilizado pelo Magistrado singular de que o controle jurisdicional sobre os atos administrativos é reservado para situações de excepcionalidade e urgência, com vistas a evitar lesão à ordem pública, saúde e economia pública revela-se contraditório com o dispositivo do julgado, porquanto restou evidenciado que o Município de Palmas apresentou relatórios e providencias pertinente, somente depois de instado à cumpri-la, sendo crível, ainda, amealhar que por diversas vezes o Autor Ministério Público denunciou nos autos a desídia do Município Requerido ´fl. 06 – APELAÇÃO1 – evento 136 – origem:

A omissão do ente estatal, por ele próprio reconhecida, revela que, ao contrário do que alega, é impositiva a confirmação da sentença, pois só assim é que, em tese, o Município de Palmas irá regularizar o serviço de fornecimento de medicamento, aparelhamento e testagem, a fim de corrigir as irregularidades apontada pelo Conselho Regional de Medicina nos Procedimentos Preparatórios 2020.0004327 e 2020.0003536 referente a Unidade de Pronto Atendimento Sul – UPA SUL e Norte UPA Norte, respectivamente, bem como sobre as notícias de fato nº 2020.0003534, 2020.0003533 tratando sobre testagem.

As denúncias apuradas em sede do Procedimento Preparatório nº 2020.0004327, encaminhadas pelo CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO TOCANTINS apontou as seguintes irregularidades:

“1.1. Existe protocolo padrão de atendimento a pacientes com suspeita ou casos confirmados de coronavírus: NÃO (Existe um fluxograma de atendimento, que segundo o acompanhante, não é seguido em praticamente nenhuma das fases.);

1.3. O protocolo está implantado e é seguido pelos profissionais de saúde: NÃO;

- 1.11. Identifica o paciente suspeito de COVID-19, desde o primeiro momento, para que os profissionais de saúde saibam reconhecer: NÃO;

- 1.12.Fornece máscara cirúrgica para o paciente na triagem de risco: NÃO;

- 4.3. O fluxo de atendimento médico do paciente com suspeita COVID-19 é diferente dos pacientes não suspeitos: NÃO;

-4.6. A equipe médica segue protocolos específicos para identificar os pacientes que devem permanecer em casa em quarentena e casos encaminhados para os serviços de referência para internação em enfermaria ou UTI: NÃO;

- 4.7. O serviço realiza coleta de exames para diagnóstico de COVID-19: NÃO;

-4.11. Dispõe de protocolo para indicação dos pacientes eleitos para a realização do exame: NÃO;

- 4.12. Dispõe de normas para coleta de material para exames: NÃO;

- 4.13. Quais os exames disponíveis: Teste Rápido;

- 4.14. Tempo médio de espera para o resultado do teste: NÃO é esperado pela unidade. Fica a cargo dos Centros de Saúde da Comunidade o monitoramento;

-4.17. Dispõe de equipamentos de exames de imagens dedicados especificamente para pacientes COVID-19: NÃO;

- 4.19.Disponibiliza exame de Tomografia de tórax 24 horas: NÃO;

- 14.2. O serviço de emergência tem local de isolamento apropriado com antecâmara e quarto com banheiro privativo para os pacientes com suspeitaCOVID19, com filtros ou ventilação adequada: NÃO;

- 14.3. Há leitos de observação específicos para pacientes suspeitos ou confirmados para COVID-19, de modo a não permanecerem no mesmo local que outros pacientes não COVID-19: NÃO;

- 14.6. Há relato de casos de funcionários afastados por COVID-19: NÃO (Segundo o acompanhante, houve no passado, mas atualmente, não há registros.);

- 14.8. Há protocolos em utilização para medicamentos antivirais ou esquema cloroquina com azitromicina: NÃO (Acompanhante informa que faltam medicamentos básicos na unidade, como azitromicina, entre outros.);

- 14.9. Realiza o monitoramento dos pacientes COVID -19 positivos: NÃO (Os Centros de Saúde da Comunidade que são responsáveis pelo monitoramento.);

- 14.10. Utiliza telemedicina: NÃO, com fim sanar as irregularidades apontadas o Conselho Regional de Medicina do Estado do Tocantins fez diversas recomendações constantes no item 14 do 2º RELATÓRIO DO PROCESSO DEFISC Nº 223/2020/TO DEMANDA Nº 498/2020/TO (doc. 03).”  

Considerando o aumento no número diário de novos casos confirmados de COVID-19 no Município de Palmas, conforme Boletim Epidemiológico SEMUS expedido na data de 19.07.2020 e Relatório do Conselho Regional de Medicina do Tocantins, visando coibir a disseminação descontrolada do vírus nesta Capital, o Ministério Público encaminhou a RECOMENDAÇÃO nº 19 e 20 a fim de que a Secretaria de Saúde adotasse as necessárias providências, o que não foi atendido pelo Município de Palmas, posto que por 06 (seis) vezes durante o trâmite processual originário, o Autor da ação Civil Pública cuidou em denunciar/alertar sobre o descumprimento da liminar por parte do ente Municipal:

A sentença objurgada consignou que: “o ente municipal cumpriu seu dever processual de fazer prova da regularidade do fluxo de atendimento de pacientes COVID-19 e a regularização dos exames relativos ao diagnóstico da referida doença, afastando as alegações da parte autora, sobretudo, porque o cerne da petição inicial se pautou num momento de instabilidade e num contexto em que todos os órgãos nacionais estavam se organizando para adequação da estrutura de suas unidades de saúde, bem como enfrentaram dificuldades para implementação de testes seguros para detecção da doença que surgiu de forma repentina.” (...) “Cumpre ainda destacar uma conduta colaborativa dos órgãos técnicos da saúde do município de Palmas que responderam prontamente, tanto na esfera administrativa, como se observa dos Ofícios direcionados à 27ª Promotoria de Justiça da Capital (Evento 26, ANEXO11), como em todas as intimações conduzidas neste feito.”

Momento de instabilidade esse que ainda não se estabilizou, bem como prova cabal de que o Município de Palmas melhorou, parcialmente, as desconformidades reconhecidas pelo próprio ente Municipal, somente e depois do ajuizamento desta demanda, o que importa o reconhecimento da medida liminar antecipada com a imposição do Município ao estrito cumprimento das desconformidades apuradas pelo CRM do Tocantins.

Causa estranheza a resiliência do Município de Palmas em dar atendimento às recomendações propugnadas pelo Conselho Regional de Medicina e pelo Ministério Público, visto que essas inconformidades podem resultar em prejuízo às ações e serviços de saúde, uma vez que a direção do SUS é pautada, primeiramente, por meio dos instrumentos de Gestão, os quais são imprescindíveis para os ajustes necessários por parte do Gestor e do Controle Social, com vistas à efetivação do direito à saúde de maneira universal, integral e igualitária.

Veja-se que o resultado da auditoria em questão evidencia falta de providências por parte do Município que obstaculiza a gestão ideal do Sistema Único de Saúde, impedindo, ainda, o aperfeiçoamento de uma gestão participativa, bem como o controle social previsto no ordenamento jurídico, cuja responsabilidade deve ser atribuída aos servidores públicos que atuam na Gestão da SEMUS/TO.

Conforme consignado no Parecer Ministerial em sede de Apelação:

“Em que pese seja respeitada a decisão, faz-se imprescindível mencionar que a petição inicial protocolada pelo Ministério Público veio acompanhada de provas documentais capazes de comprovar as irregularidades no fluxo de atendimentos e testagem dos pacientes nas unidades de saúde do Município, tal como os documentos que acompanhavam os Procedimentos Preparatórios 2020.0004327 e 2020.0003536, vistorias realizadas pelo CRM/TO, nas Upas de Palmas/TO, nos dias 28 de maio de 2020 e 15 de julho de 2020 nas UPAs SUL e NORTE, respectivamente (ANEXOS PET INI3, ANEXOS PET INI4, ANEXOS PET INI7, ANEXOS PET INI9).

O Ofício nº 2467/2020 de 29 de setembro de 2020 (Evento 20), apresentado pelo Apelado, documento este que o D. Magistrado utiliza para firmar seu convencimento no cumprimento das irregularidades, não é suficiente para tanto, vez que o Apelante peticionou diversas outras vezes nos autos judiciais a fim de demonstrar as irregularidades e descumprimento da liminar pelo Município de Palmas. Importante mencionar que na r. sentença o MM. Juiz faz menção a reclamação recebida por esta Promotoria de Justiça acerca da demora na disponibilização de teste Covid-19, Procedimento Extrajudicial 2020.0005334.

Embora na decisão o D. Julgador manifeste suficiente a resposta apresentada pelo Município de Palmas, faz-se necessário esclarecer que no Memorando nº 1500/2020 (Evento 26 – ANEXO9) menciona que o cidadão foi consultado no dia 04/08/2020 e realizado o teste apenas no dia 19/08/2020, ou seja, passado prazo necessário para realização do mesmo, demonstrando as irregularidades nas testagens realizadas pelo Apelado.

No Relatório de vistoria DEFISC nº 241/2017 – Demanda nº 441/2020/TO, em vistoria do CRM realizada no dia 05/06/2020 no Centro de Saúde da Comunidade Laurides Lima Milhomem (Evento 26 – ANEXO11), foi constatado irregularidades no fluxo de atendimento de UBS – UPA, manifestando conflito quanto ao atendimento dos pacientes, não sendo realizado na unidade de saúde agendamento para teste de Covid-19, bem como não disponibilizando treinamentos/informações com equipe multiprofissional para enfrentamento do Covid-19.

Da mesma forma, no 3º Relatório do Processo 317/2018/TO – Demanda nº 343/2020/TO, foi averiguado pelo CRM no Centro de Saúde da Comunidade Liberdade em vistoria realizada em 12/08/2020 (Evento 26 – ANEXO12) irregularidades em não dispor de equipe de profissionais especificamente designados para o atendimento com suspeita Covid-19, em desconformidade com a Nota Técnica GVIMS/GGTES/ANVISA Nº 04/2020.

O 3º Relatório do Processo 311/2018/TO – Demanda nº 339/2020/TO foi constatado pelo CRM no Centro de Saúde da Comunidade Eugenio Pinheiro da Silva em 23/07/2020 (Evento26 – ANEXO13) irregularidades quanto a falta de identificação do paciente suspeito de Covid19 desde o primeiro momento, não existindo protocolo padrão de atendimento a pacientes com suspeita ou casos confirmados de Covid-19, equipe de profissionais especificamente designada para atendimento de pacientes com suspeita Covid-19, restrição a realização do exame diagnostico.

Importante mencionar que no 3º Relatório do Processo 362/2020/TO – Demanda nº 362/2020/TO em vistoria realizada pelo CRM no Centro de Saúde da Comunidade Jose Hermes em 13/08/2020 (Evento 26 – ANEXO15), houve relato do médico responsável pelo atendimento quanto a dificuldade na demora para o resultado dos testes.”

Acentua-se a fragilidade das alegações do Município Apelado ao asseverar que o Ofício n. 2467/2020, de 29 de setembro de 2021, da Secretaria Municipal da Saúde, esclareceu quanto à implementação do fluxo diferenciado e sinalizado para pacientes suspeitos de contaminação pela COVID-19; à comprovação do treinamento dos profissionais de saúde atuantes nas UPAS, dentre outros (fls. 11/12 – CONT MIN1 – evento 166 – origem), DEPOIS DE DECORRIDOS EXATOS 01 (UM) ANO DA TUTELA ANTECIPADA DEFERIDA na data de 22/09/2020 – evento 12 – origem.

A sentença objurgada consignou, ainda, que: “o controle jurisdicional sobre os atos administrativos é reservado para situações de excepcionalidade e urgência, com vistas a evitar lesão à ordem pública, saúde e economia pública. Por certo, a ausência de ilegalidade ou omissão na organização e coordenação do combate à crise epidemiológica, não induz a abertura de espaço para interferência do Judiciário, cuja atividade funcional se reserva apenas para circunstâncias excepcionais, de forma a não conflagrar interferência entre os poderes.”

Não obstante, deixou de mencionar que, em casos tais onde a inércia da Administração prepondera sobre o interesse social, notadamente a Saúde Pública, poderá o Poder Judiciário intervir nos critérios discricionários do Gestor Público, sem ferir qualquer dos princípios administrativos ou da separação dos poderes.

Não se trata de qualquer interferência do Poder Judiciário no mérito do ato administrativo, mas sim de dar efetivo cumprimento ao disposto na legislação, frente à flagrante postura omissa do Município de Palmas de cumpri-la espontaneamente.

Veja-se que o que se busca nesta ação é o controle da Administração Pública pelo Poder Judiciário naquilo que é da sua competência, com vista, unicamente, à correção das inconformidades detectadas pelo Conselho Regional de Medicina do Tocantins, através de fiscalização realizada pelo referido Órgão, considerando, sobretudo, que a falta de providência por parte do Município, no sentido de sanar as mencionadas inconformidades, afronta o direito constitucional à saúde.

Ademais, a atividade jurisdicional é ferramenta essencial para que os direitos sociais dos cidadãos sejam executados pelo Município sem omissão e de forma eficaz, visto que a essencialidade do direito à saúde fez com que o legislador constituinte qualificasse como prestações de relevância pública as ações e serviços de saúde, de forma a legitimar a atuação do Ministério Público e do Poder Judiciário nas hipóteses em que o Estado – lato sensu, através de sua Secretaria de Saúde, por exemplo, anomalamente deixe de respeitar o mandamento constitucional, frustrando-lhe arbitrariamente a eficácia jurídico-social, seja por intolerável omissão, seja por qualquer outra inaceitável modalidade de comportamento governamental desviante. Nesse sentido:

REPERCUSSÃO GERAL. RECURSO DO MPE CONTRA ACÓRDÃO DO TJRS. REFORMA DE SENTENÇA QUE DETERMINAVA A EXECUÇÃO DE OBRAS NA CASA DO ALBERGADO DE URUGUAIANA. ALEGADA OFENSA AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES E DESBORDAMENTO DOS LIMITES DA RESERVA DO POSSÍVEL. INOCORRÊNCIA. DECISÃO QUE CONSIDEROU DIREITOS CONSTITUCIONAIS DE PRESOS MERAS NORMAS PROGRAMÁTICAS. INADMISSIBILIDADE. PRECEITOS QUE TÊM EFICÁCIA PLENA E APLICABILIDADE IMEDIATA. INTERVENÇÃO JUDICIAL QUE SE MOSTRA NECESSÁRIA E ADEQUADA PARA PRESERVAR O VALOR FUNDAMENTAL DA PESSOA HUMANA. OBSERVÂNCIA, ADEMAIS, DO POSTULADO DA INAFASTABILIDADE DA JURISDIÇÃO. RECURSO CONHECIDO E PROVIDO PARA MANTER A SENTENÇA CASSADA PELO TRIBUNAL.  I - É lícito ao Judiciário impor à Administração Pública obrigação de fazer, consistente na promoção de medidas ou na execução de obras emergenciais em estabelecimentos prisionais. II - Supremacia da dignidade da pessoa humana que legitima a intervenção judicial. III - Sentença reformada que, de forma correta, buscava assegurar o respeito à integridade física e moral dos detentos, em observância ao art. 5º, XLIX, da Constituição Federal. IV - Impossibilidade de opor-se à sentença de primeiro grau o argumento da reserva do possível ou princípio da separação dos poderes. V - Recurso conhecido e provido" (STF - RE n. 592581 - Rel. Min. Ricardo Lewandowski - DJe de 01.02.2016).

EMENTA: APELAÇÃO CÍVEL. REMESSA NECESSÁRIA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. RECURSO INTERPOSTO PELO ESTADO DO TOCANTINS. SAÚDE PÚBLICA. INCONFORMIDADES DETECTADAS PELO MINISTÉRIO DA SAÚDE ATRAVÉS DA AUDITORIA Nº 15628. DENASUS. ALEGADA OFENSA AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES E DESBORDAMENTO DOS LIMITES DA RESERVA DO POSSÍVEL. CONTROLE JUDICIAL DAS POLÍTICAS PÚBLICAS. OFENSA AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES. INOCORRÊNCIA. REEXAME NECESSÁRIO NÃO CONHECIDO. APELO CONHECIDO E IMPROVIDO. SENTENÇA MANTIDA. 1. Por aplicação analógica da primeira parte do art. 19 da Lei 4.717/1965, as sentenças de improcedência de Ação Civil Pública sujeitam-se, indistintamente, ao reexame necessário (REsp 1.108.542/SC, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, DJe 29/5/2009). Em que pese a sentença consignar sujeição ao reexame necessário, tal declaração encontra-se equivocada, tendo em vista que o Autor da Ação Civil Pública sagrou-se vencedor, ou seja, a legislação especial prevê a obrigatoriedade da remessa de ofício somente nos casos em que a sentença tenha sido julgada improcedente. Deste modo, impõe-se o não conhecimento da remessa necessária. 2. In casu, o Ministério Público objetiva provimento jurisdicional com vistas a compelir o Estado do Tocantins na prestação de fazer, consistente em sanar as inconformidades detectadas pelo Ministério da Saúde, através da Auditoria nº 15628, realizada pelo Departamento Nacional de Auditoria do Sistema Único de Saúde na Secretaria de Estado da Saúde, com a finalidade de auditar, por amostragem, a veracidade das inconformidades constantes do Relatório Anual de Gestão (RAG), em cumprimento ao disposto no art. 42 da Lei Complementar nº 141/20121, e que o objeto desta ação limita-se à regularização das inconformidades, por meio do cumprimento das Recomendações firmadas pelo DENASUS/MS dirigidas à Secretaria de Estado da Saúde - SESAU, no que tange aos seguintes subgrupos auditados: Plano de Saúde; Conselho de Saúde; Relatório de Gestão; Resultado; Vigilância Epidemiológica e Execução Orçamentária. 3. Extrai-se dos autos que restou comprovado o descumprimento da legislação de regência, no que tange a obrigatoriedade de regularizar as inconsistências apuradas em Auditoria do Departamento Nacional de Auditoria do SUS (DENASUS), instaurada e concluída em 26 de novembro de 2015 com o objetivo de verificar a veracidade das informações contidas no Relatório Anual de Gestão (RAG) do exercício de 2013 da SES/TO, dos indicadores definidos no Plano de Saúde (PS 2012-2015) e no Programa Anual de Saúde (PAS) de 2013. 4. Causa estranheza a resiliência do Estado do Tocantins em dar atendimento às recomendações propugnadas pelo DENAUS, visto que essas inconformidades podem resultar em prejuízo às ações e serviços de saúde, uma vez que a direção do SUS é pautada, primeiramente, por meio dos instrumentos de Gestão, os quais são imprescindíveis para os ajustes necessários, por parte do Gestor e do Controle Social, com vistas à efetivação do direito à saúde, de maneira universal, integral e igualitária. 5. A Reserva do Possível não pode ser invocada como fundamento para afastar o mínimo existencial do cidadão em se tratando do direito à saúde, garantido constitucionalmente, mormente quando não houver comprovação objetiva da incapacidade econômico-financeira do ente estatal. 6. Não há que falar em lesão ao princípio da separação dos poderes, já que o Poder Judiciário limitou-se a dar aplicabilidade à norma constitucional que garante o acesso universal aos serviços de saúde a todo e qualquer cidadão que dela necessitar, especialmente quando não cumprida espontaneamente pelo Poder Público. 7. Reexame necessário não conhecido. Apelação conhecida e improvida. Sentença mantida. (AP nº 00166462920178272729. Rejator Juiz Convocado JOCY GOMES DE ALMEIDA. Julgado em 10/02/2021).

A sentença objurgada deixou de asseverar que as inconformidades relacionadas resultam em insegurança quanto à qualidade da assistência prestada, principalmente pela falta de informação do efetivo cumprimento das metas e políticas públicas estabelecidas pelo Ministério da Saúde.

Além do que, a sentença deixou de analisar com acuidade cada uma das inconformidades apresentadas pela fiscalização do CRM/TO, revelando, com impropriedade, a rejeição dos pedidos formulados na inicial – SENT1 – evento 132 – origem:

Comungo do entendimento esposado na Apelação de que o Município não demonstrou, através da prova produzida nos presentes autos, à observância a todos os indicadores e recomendações vinculados à fiscalização do CRM/TO.

Ademais, como decorrência lógica das irregularidades constatadas no Procedimento Preparatório nº 2020.0004327, o ente Municipal elaborou plano de ação para saná-las, conduta que não afasta o reconhecimento da obrigação de fazer.

Importante consignar que a omissão verificada e comprovada, agregada pelo não atendimento das leis, interfere e viola o Direito Fundamental à Saúde, autorizando a atuação do Poder Judiciário com vistas a garantir o cumprimento das normas, visto que o comando judicial impõe ao recorrido tão somente dar cumprimento à legislação, o mister da sua existência, visto ter o Poder Judiciário pautado sua atuação com observância aos limites constitucionalmente estabelecidos, inexistindo violação ao Princípio da Separação dos Poderes.

Sobre o tema:

APELAÇÃO CÍVEL. INTEMPESTIVIDADE. REMESSA NECESSÁRIA. SAÚDE PÚBLICA. RESERVA DO POSSÍVEL. CONTROLE JUDICIAL DAS POLÍTICAS PÚBLICAS. OFENSA AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES. RECURSO VOLUNTÁRIO NÃO CONHECIDO. REEXAME NECESSÁRIO NÃO PROVIDO. 1 – O apelo é intempestivo, pois o prazo para o seu aviamento findou no dia 14/12/2017, mas o protocolo ocorreu somente no dia 18/12/2017. 2 – Sendo o direito à saúde também consagrado no artigo 6º da Constituição Federal, incumbe ao Poder Judiciário, quando da omissão do Poder Executivo na implementação e efetivação dos direitos fundamentais, agir com celeridade e assegurar o cumprimento dos comandos constitucionais. 3 – A Reserva do Possível não pode ser invocada como fundamento para afastar o mínimo existencial do cidadão em se tratando do direito à saúde, garantido constitucionalmente, mormente quando não houver comprovação objetiva da incapacidade econômico-financeira do ente estatal. 4– Não há que se falar em lesão ao princípio da separação dos poderes, já que o Poder Judiciário limitou-se a dar aplicabilidade à norma constitucional que garante o acesso universal aos serviços de saúde a todo e qualquer cidadão que dela necessitar, especialmente quando não cumprida espontaneamente pelo Poder Público. 5 –Recurso voluntário não conhecido. Reexame Necessário não provido. TJTO. AP nº 00054142520188270000. Rel(a). MAYSA VENDRAMINI ROSAL. 4ª Turma da 1ª Câmara Cível. Julgado em 18/07/2018.

A partir da consolidação constitucional dos direitos sociais, a função estatal foi modificada e deixou de ser apenas legisladora, tornou-se mais ativa na concretização das políticas públicas. Ao lado da administração pública, que tem o dever de criar e implementar políticas públicas, está o Poder Judiciário, como órgão controlador da atividade administrativa, para assegurar os direitos sociais constitucionalmente garantidos.

Desta forma, a Constituição Federal (art. 196) assegura o direito à saúde como direito fundamental do ser humano, sendo direito de todos e dever do Estado (Entes da Federação), que deve promover as condições necessárias para sua execução, descabendo condicioná-lo à boa vontade do administrador e a previsão orçamentária, principalmente em situação de urgência, pois, constitui norma de aplicabilidade imediata e eficácia plena.

Nesse sentido é o entendimento do Superior Tribunal de Justiça e Supremo Tribunal Federal:

ADMINISTRATIVO. CONTROLE JUDICIAL DE POLÍTICAS PÚBLICAS. POSSIBILIDADE EM CASOS EXCEPCIONAIS - DIREITO À SAÚDE. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS. MANIFESTA NECESSIDADE. OBRIGAÇÃO SOLIDÁRIA DE TODOS OS ENTES DO PODER PÚBLICO. NÃO OPONIBILIDADE DA RESERVA DO POSSÍVEL AO MÍNIMO EXISTENCIAL. POSSIBILIDADE. FIXAÇÃO. MULTA DIÁRIA. DESCUMPRIMENTO DE DETERMINAÇÃO JUDICIAL. (...) 2. Não podem os direitos sociais ficar condicionados à boa vontade do Administrador, sendo de suma importância que o Judiciário atue como órgão controlador da atividade administrativa. Seria distorção pensar que o princípio da separação dos poderes, originalmente concebido com o escopo de garantia dos direitos fundamentais, pudesse ser utilizado justamente como óbice à realização dos direitos sociais, igualmente relevantes. 3. Tratando-se de direito essencial, incluso no conceito de mínimo existencial, inexistirá empecilho jurídico para que o Judiciário estabeleça a inclusão de determinada política pública nos planos orçamentários do ente político, mormente quando não houver comprovação objetiva da incapacidade econômico financeira da pessoa estatal. (...) 7. Recurso Especial não provido. (STJ - REsp 1488639/SE, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, Segunda Turma, julgado em 20/11/2014, DJe 16/12/2014)

AMPLIAÇÃO E MELHORIA NO ATENDIMENTO DE GESTANTES EM MATERNIDADES ESTADUAIS – DEVER ESTATAL DE ASSISTÊNCIA MATERNO-INFANTIL RESULTANTE DE NORMA CONSTITUCIONAL – OBRIGAÇÃO JURÍDICO- CONSTITUCIONAL QUE SE IMPÕE AO PODER PÚBLICO, INCLUSIVE AOS ESTADOS-MEMBROS – CONFIGURAÇÃO, NO CASO, DE TÍPICA HIPÓTESE DE OMISSÃO INCONSTITUCIONAL IMPUTÁVEL AO ESTADO-MEMBRO – DESRESPEITO À CONSTITUIÇÃO PROVOCADO POR INÉRCIA ESTATAL (RTJ 183/818-819) – COMPORTAMENTO QUE TRANSGRIDE A AUTORIDADE DA LEI FUNDAMENTAL DA REPÚBLICA (RTJ 185/794-796) – A QUESTÃO DA RESERVA DO POSSÍVEL: RECONHECIMENTO DE SUA INAPLICABILIDADE, SEMPRE QUE A INVOCAÇÃO DESSA CLÁUSULA PUDER COMPROMETER O NÚCLEO BÁSICO QUE QUALIFICA O MÍNIMO EXISTENCIAL (RTJ 200/191-197) – O PAPEL DO PODER JUDICIÁRIO NA IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS INSTITUÍDAS PELA CONSTITUIÇÃO E NÃO EFETIVADAS PELO PODER PÚBLICO – A FÓRMULA DA RESERVA DO POSSÍVEL NA PERSPECTIVA DA TEORIA DOS CUSTOS DOS DIREITOS: IMPOSSIBILIDADE DE SUA INVOCAÇÃO PARA LEGITIMAR O INJUSTO INADIMPLEMENTO DE DEVERES ESTATAIS DE PRESTAÇÃO CONSTITUCIONALMENTE IMPOSTOS AO ESTADO (...) CONTROLE JURISDICIONAL DE LEGITIMIDADE DA OMISSÃO DO ESTADO: ATIVIDADE DE FISCALIZAÇÃO JUDICIAL QUE SE JUSTIFICA PELA NECESSIDADE DE OBSERVÂNCIA DE CERTOS PARÂMETROS CONSTITUCIONAIS (PROIBIÇÃO DE RETROCESSO SOCIAL, PROTEÇÃO AO MÍNIMO EXISTENCIAL, VEDAÇÃO DA PROTEÇÃO INSUFICIENTE E PROIBIÇÃO DE EXCESSO) – DOUTRINA – PRECEDENTES DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL EM TEMA DE IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS DELINEADAS NA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA (RTJ 174/687 – RTJ 175/1212-1213 – RTJ 199/1219-1220) (...) RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. (STF - RE 581352 AgR, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, julgado em 29/10/2013, ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-230 DIVULG 21-11-2013 PUBLIC 22-112013).

Entendimento seguido por este egrégio Tribunal de Justiça, na parte que interessa:

EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. DIREITO À SAÚDE. IMPOSSIBILIDADE DO CONTROLE JUDICIAL SOBRE AS POLÍTICAS PÚBLICAS E RESERVA DO POSSÍVEL. DESCABIMENTO. MANIFESTA OMISSÃO ESTATAL EM GARANTIR À ASSISTIDA O DIREITO À SAÚDE DIGNA. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DO MÍNIMO EXISTENCIAL. SUSPENSÃO DO PRAZO PARA CUMRPIMENTO DA LIMINAR. IMPOSSIBILIDADE DADA A RECALCITRÂNCIA DO ESTADO. MEDIDA DESCUMPRIDA. PEDIDO DE AFASTAMENTO OU REDUÇÃO DE MULTA DIÁRIA (ASTREINTES). IMPOSSIBILIDADE. LIMITAÇÃO TEMPORAL DAS ATREINTES. CABIMENTO. RECURSO CONHECIDO E IMPROVIDO. (...) A cláusula da "reserva do possível" - ressalvada a ocorrência de justo motivo objetivamente aferível - não pode ser invocada, pelo Estado, com a finalidade de exonerar-se do cumprimento de suas obrigações constitucionais, notadamente quando, dessa conduta governamental negativa, puder resultar nulificação ou, até mesmo, aniquilação de direitos constitucionais impregnados de um sentido de essencial fundamentalidade. Precedentes do STF. 5. A aplicabilidade da reserva do possível só é admitida em situações excepcionais, e desde que demonstrada, de forma objetiva, a impossibilidade ou incapacidade econômico-financeira de se atender à determinação judicial de viabilização de fornecimento de medicamentos, o que não ocorreu no caso concreto. Precedentes do TJTO. (...) 8. Agravo de instrumento conhecido e improvido. (AI 0007185-43.2015.827.0000, Rel. Desa. ETELVINA MARIA SAMPAIO FELIPE, 5ª Turma da 1ª Câmara Cível, julgado em 04/11/2015).

EMENTA: APELAÇÃO E REEXAME NECESSÁRIO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. REALIZAÇÃO DE EXAME MÉDICO. BIÓPSIA PARA DIAGNÓSTICO DE CÂNCER. NECESSIDADE COMPROVADA. DIREITO A SAÚDE. LEGITIMIDADE PASSIVA DO MUNICÍPIO. AFASTADA. OBRIGAÇÃO SOLIDÁRIA ENTRE OS ENTES FEDERADOS. INOCORRÊNCIA DE INGERÊNCIA DO PODER JUDICIÁRIO SOBRE AS POLÍTICAS PÚBLICAS. PRINCÍPIO DA RESERVA DO POSSÍVEL. INAPLICABILIDADE (...) 4. Configurada a inércia da Administração Pública, incumbe ao Poder Judiciário, quando provocado, assegurar o cumprimento do direito à saúde, constitucionalmente previsto, sem que isso caracterize ingerência do Poder Judiciário sobre as políticas públicas. (AP REENEC 0002219-03.2016.827.0000, Rel. Des. JOÃO RIGO, 3ª TURMA DA 2ª CÂMARA CÍVEL, julgado em 13/04/2016).

Nesse contexto, imperativo que se proceda à reforma do julgado, uma vez que se verifica escólio legal para o provimento do apelo.

Ante o exposto, em consonância com o Parecer Ministerial, encaminho o meu voto no sentido de CONHECER do recurso e da Remessa Necessária, pois presentes os pressupostos de admissibilidade para, no mérito, DAR PROVIMENTO ao apelo e ao reexame, para reformar a sentença objurgada, para ratificar a tutela antecipada constante do evento 12 – origem, bem como acolher integralmente os pedidos formulados na inicial, constantes dos itens 1.1 e 2 a 10 (fls. 40/42 – INIC1 – evento 01 – origem), para que o Município de Palmas adote, no prazo de 30 (trinta) dias, as providências necessárias à integral adoção das medidas, sem prejuízo da aplicação de evnetuais sanções penais e administrativas no caso de descumprimento. Incabível a majoração dos honorários advocatícios recursais, diante da ausência de sua fixação na origem e da especificidade da causa.



Documento eletrônico assinado por JOCY GOMES DE ALMEIDA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Instrução Normativa nº 5, de 24 de outubro de 2011. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.tjto.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 513748v2 e do código CRC 8005de12.

Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): JOCY GOMES DE ALMEIDA
Data e Hora: 19/5/2022, às 9:44:40

 


 


Documento:513747
Poder Judiciário
JUSTIÇA ESTADUAL
Tribunal de Justiça do Estado do Tocantins
GAB. DO DES. RONALDO EURIPEDES

Apelação/Remessa Necessária Nº 0033750-29.2020.8.27.2729/TO

PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 0033750-29.2020.8.27.2729/TO

RELATOR: Juiz JOCY GOMES DE ALMEIDA

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO (AUTOR)

APELADO: MUNICIPIO DE PALMAS (RÉU)

INTERESSADO: Autoridade Coatora - TRIBUNAL DE JUSTICA DO ESTADO DO TOCANTINS - Palmas

APELAÇÃO CÍVEL. REMESSA NECESSÁRIA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. RECURSO INTERPOSTO PELO AUTOR MINISTÉRIO PÚBLICO. SAÚDE PÚBLICA. MUNICÍPIO DE PALMAS. INCONFORMIDADES DETECTADAS PELO CONSELHO REGIONAL DE MEDICINA DO TOCANTINS. PRESTAÇÃO DO SERVIÇO PÚBLICO DE REALIZAÇÃO DE EXAMES EM PACIENTES COM SUSPEITA DE COVID19. FORNECIMENTO DE MEDICAMENTOS NECESSÁRIO AO TRATAMENTO. LIMINAR SATISFATIVA. PERDA DO OBJETO DA AÇÃO. NÃO OCORRÊNCIA. ALEGADA OFENSA AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES E DESBORDAMENTO DOS LIMITES DA RESERVA DO POSSÍVEL. CONTROLE JUDICIAL DAS POLÍTICAS PÚBLICAS. OFENSA AO PRINCÍPIO DA SEPARAÇÃO DOS PODERES. INOCORRÊNCIA. REEXAME NECESSÁRIO E APELAÇÃO CÍVEL CONHECIDOS E PROVIDOS.

1. Por aplicação analógica da primeira parte do art. 19 da Lei 4.717/1965, as sentenças de improcedência de Ação Civil Pública sujeitam-se, indistintamente, ao reexame necessário (REsp 1.108.542/SC, Rel. Ministro Castro Meira, Segunda Turma, DJe 29/5/2009).

2. In casu, o Ministério Público objetiva provimento jurisdicional para compelir o Município de Palmas na prestação de fazer, consistente em corrigir as irregularidades evidenciadas pelo Conselho Regional de Medicina do Estado do Tocantins, que ensejou a instauração dos Procedimentos Preparatórios 2020.0004327 e 2020.0003536, bem como as Notícias de Fato nº 2020.0003534, 2020.0003533 e 2020.0003932 e irregularidades detectadas pelo Conselho Municipal de Saúde na UPA SUL, com o fim de garantir a prestação do serviço público de realização de exames em pacientes com suspeita de COVID 19, bem como o fornecimento de medicamentos necessário ao tratamento.

3. A suposta regularização das pendências somente foram realizadas após o deferimento do pedido de tutela provisória de urgência, o que corroborou a necessidade de ingressar com a presente medida judicial, pois houve, portanto, o mero cumprimento da decisão que deferiu a tutela provisória de urgência, o que não esgota o interesse do Ministério Público em ver o direito dos usuários assegurados pelo julgamento definitivo da demanda e acobertado pela coisa julgada material.

4. O entendimento do STJ está firmado no sentido de que o simples fato do cumprimento da ordem em antecipação de tutela não implica a perda do objeto da demanda ou a falta de interesse processual, sendo necessário o julgamento do mérito da causa, para definir se a parte beneficiada, de fato, fazia jus a tal pretensão.

5. A suposta regularização das falhas apontadas pelo Município de Palmas somente se deu após o deferimento do pedido de tutela provisória de urgência, o que não rechaça a necessidade de a matéria ser acobertada pela coisa julgada material, a fim de garantir, em definitivo, o direito dos usuários do Sistema Único de Saúde. Ademais, como visto, a antecipação dos efeitos da tutela não exaure o objeto da demanda, porquanto apenas antecipa a tutela jurisdicional, como se extrai da própria expressão, que oportunamente deverá ser confirmada, ou não, por sentença, subsistindo, portanto, o interesse processual da parte.

6. Causa estranheza a resiliência do Município de Palmas em dar atendimento às recomendações propugnadas pelo Conselho Regional de Medicina do Tocantins, visto que essas inconformidades podem resultar em prejuízo às ações e serviços de saúde, uma vez que a direção do SUS é pautada, primeiramente, por meio dos instrumentos de Gestão, os quais são imprescindíveis para os ajustes necessários, por parte do Gestor e do Controle Social, com vistas à efetivação do direito à saúde, de maneira universal, integral e igualitária.

7. A Reserva do Possível não pode ser invocada como fundamento para afastar o mínimo existencial do cidadão em se tratando do direito à saúde, garantido constitucionalmente, mormente quando não houver comprovação objetiva da incapacidade econômico-financeira do ente Municipal.

8. Não há que falar em lesão ao princípio da separação dos poderes, já que o Poder Judiciário limitou-se a dar aplicabilidade à norma constitucional que garante o acesso universal aos serviços de saúde a todo e qualquer cidadão que dela necessitar, especialmente quando não cumprida espontaneamente pelo Poder Público.

9. Reexame Necessário e Apelação Cível conhecidos e providos, para acolher os pedidos formulados na inicial.

ACÓRDÃO

A a Egrégia 2ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado do Tocantins decidiu, por unanimidade, CONHECER do recurso e da Remessa Necessária, pois presentes os pressupostos de admissibilidade para, no mérito, DAR PROVIMENTO ao apelo e ao reexame, para reformar a sentença objurgada, para ratificar a tutela antecipada constante do evento 12 ? origem, bem como acolher integralmente os pedidos formulados na inicial, constantes dos itens 1.1 e 2 a 10 (fls. 40/42 ? INIC1 ? evento 01 ? origem), para que o Município de Palmas adote, no prazo de 30 (trinta) dias, as providências necessárias à integral adoção das medidas, sem prejuízo da aplicação de evnetuais sanções penais e administrativas no caso de descumprimento. Incabível a majoração dos honorários advocatícios recursais, diante da ausência de sua fixação na origem e da especificidade da causa, nos termos do voto do(a) Relator(a).

Palmas, 11 de maio de 2022.



Documento eletrônico assinado por JOCY GOMES DE ALMEIDA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Instrução Normativa nº 5, de 24 de outubro de 2011. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.tjto.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 513747v3 e do código CRC e3ae5659.

Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): JOCY GOMES DE ALMEIDA
Data e Hora: 25/5/2022, às 16:1:8

 


 


Documento:513746
Poder Judiciário
JUSTIÇA ESTADUAL
Tribunal de Justiça do Estado do Tocantins
GAB. DO DES. RONALDO EURIPEDES

Apelação/Remessa Necessária Nº 0033750-29.2020.8.27.2729/TO

PROCESSO ORIGINÁRIO: Nº 0033750-29.2020.8.27.2729/TO

RELATOR: Juiz JOCY GOMES DE ALMEIDA

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO (AUTOR)

APELADO: MUNICIPIO DE PALMAS (RÉU)

INTERESSADO: Autoridade Coatora - TRIBUNAL DE JUSTICA DO ESTADO DO TOCANTINS - Palmas

RELATÓRIO

Trata-se de Remessa Necessária e Apelação Cível interposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO contra a sentença proferida pelo Juízo da Vara de Execuções Fiscais e Saúde da Comarca de Palmas – TO que, nos autos da Ação Civil Pública nº 00337502920208272729, ajuizada pelo insurgente em desfavor do MUNICÍPIO DE PALMAS rejeitou os pedidos formulados na inicial, por entender que o controle jurisdicional sobre os atos administrativos é reservado para situações de excepcionalidade e urgência, com vistas a evitar lesão à ordem pública, saúde e economia pública, sendo que a ausência de ilegalidade ou omissão na organização e coordenação do combate à crise epidemiológica, não induz a abertura de espaço para interferência do Judiciário, cuja atividade funcional se reserva apenas para circunstâncias excepcionais, de forma a não conflagrar interferência entre os poderes..

Relata que o Ministério Público objetiva provimento jurisdicional com vistas a compelir o Município de Palmas na prestação de fazer, consistente em regularizar o serviço de fornecimento de medicamento, aparelhamento e testagem com a correção das irregularidades apontada pelo Conselho Regional de Medicina nos Procedimentos Preparatórios 2020.0004327 e 2020.0003536, referente às Unidades de Pronto Atendimento UPA SUL e UPA Norte de Palmas/TO.

Aduz o Ministério Público Apelante que o Ofício nº 2467/2020 de 29 de setembro de 2020 (Evento 20), apresentado pelo Apelado, documento este que o D. Magistrado utiliza para firmar seu convencimento no cumprimento das irregularidades, não é suficiente para tanto, uma vez que o Apelante peticionou diversas outras vezes nos autos a fim de demonstrar as irregularidades e descumprimento da liminar pelo Município de Palmas, muito embora na decisão o D. Julgador manifeste suficiente a resposta apresentada pelo Município de Palmas, faz-se necessário esclarecer que no Memorando nº 1500/2020 (Evento 26 – ANEXO9) menciona que o cidadão foi consultado no dia 04/08/2020 e realizado o teste apenas no dia 19/08/2020, ou seja, passado prazo necessário para realização do mesmo, demonstrando as irregularidades nas testagens realizadas pelo Apelado.

Alega que no Relatório de vistoria DEFISC nº 241/2017 – Demanda nº 441/2020/TO, em vistoria do CRM realizada no dia 05/06/2020 no Centro de Saúde da Comunidade Laurides Lima Milhomem (Evento 26 – ANEXO11), foi constatado irregularidades no fluxo de atendimento de UBS – UPA, manifestando conflito quanto ao atendimento dos pacientes, não sendo realizado na unidade de saúde agendamento para teste de Covid-19, bem como não disponibilizando treinamentos/informações com equipe multiprofissional para enfrentamento do Covid-19e, da mesma forma, no 3º Relatório do Processo 317/2018/TO – Demanda nº 343/2020/TO, foi averiguado pelo CRM no Centro de Saúde da Comunidade Liberdade em vistoria realizada em 12/08/2020 (Evento 26 – ANEXO12) irregularidades em não dispor de equipe de profissionais especificamente designados para o atendimento com suspeita Covid-19, em desconformidade com a Nota Técnica GVIMS/GGTES/ANVISA Nº 04/2020.

Afirma que durante todo o trâmite processual restou devidamente comprovada as irregularidades quanto ao fluxo de atendimento aos pacientes Covid-19, triagem, segurança dos protocolos de atendimento e a regularização dos exames relativos ao diagnóstico da doença (testagem) por parte do Município de Palmas, sendo contraditória a r. sentença que julgou pela improcedência da ação civil pública, sendo que no decorrer de todo o processo judicial o MM. Juiz a quo proferiu decisões atendendo as pretensões do Ministério Público para regularizar o atendimento aos usuários nas unidades de saúde do Município de Palmas, visando o atendimento eficaz e seguro aos pacientes com Covid-19 ou suspeita, evitando maior contágio e proliferação do vírus, com uma testagem eficiente, a fim de permitir um rápido diagnósticos e tratamento, desta forma, diante da contrariedade da sentença diante das provas documentais juntadas aos autos, faz-se imprescindível que o E. Tribunal de Justiça proceda com a reforma da decisão de piso, julgando a Ação Civil Pública procedente nos termos requeridos na inicial.

Assevera que as supostas regularizações das pendências somente foram realizadas após o deferimento do pedido de tutela provisória de urgência (evento 12), o que corroborou a necessidade de ingressar com a presente medida judicial, ademais, houve, portanto, o mero cumprimento da decisão que deferiu a tutela provisória de urgência, o que não esgota o interesse do Ministério Público em ver o direito dos usuários assegurados pelo julgamento definitivo da demanda e acobertado pela coisa julgada material.

Requer o conhecimento e o provimento do presente recurso de apelação, com a consequente reforma da sentença recorrida, a fim de julgar totalmente procedente a Ação Civil Pública originária.

Intimado, o apelado Município de Palmas apresentou contrarrazões ao recurso – evento 166 – origem, pugnando pelo improvimento do apelo, sendo mantida a sentença proferida pelo douto julgador monocrático em todos os seus termos.

Instado a se manifestar, o Procurador de Justiça de Cúpula, no parecer constante do evento 10, manifestou-se pelo conhecimento e provimento da Apelação Cível, a fim de que sejam julgados procedentes os pedidos deduzidos na ação civil pública originária.

É o RELATÓRIO.

Nos termos do artigo 38, V, "b" do Regimento Interno desta Corte de Justiça, peço dia para julgamento.



Documento eletrônico assinado por JOCY GOMES DE ALMEIDA, Relator, na forma do artigo 1º, inciso III, da Lei 11.419, de 19 de dezembro de 2006 e Instrução Normativa nº 5, de 24 de outubro de 2011. A conferência da autenticidade do documento está disponível no endereço eletrônico http://www.tjto.jus.br, mediante o preenchimento do código verificador 513746v2 e do código CRC 998cc94e.

Informações adicionais da assinatura:
Signatário (a): JOCY GOMES DE ALMEIDA
Data e Hora: 11/4/2022, às 11:53:30

 


 


Extrato de Ata
Poder Judiciário
Tribunal de Justiça do Estado do Tocantins

EXTRATO DE ATA DA SESSÃO ORDINÁRIA DE 11/05/2022

Apelação/Remessa Necessária Nº 0033750-29.2020.8.27.2729/TO

RELATOR: Juiz JOCY GOMES DE ALMEIDA

PROCURADOR(A): MOACIR CAMARGO DE OLIVEIRA

APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO (AUTOR)

APELADO: MUNICIPIO DE PALMAS (RÉU)

Certifico que a 2ª CÂMARA CÍVEL, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:

A 3ª TURMA JULGADORA DA 2ª CÂMARA CÍVEL DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER DO RECURSO E DA REMESSA NECESSÁRIA, POIS PRESENTES OS PRESSUPOSTOS DE ADMISSIBILIDADE PARA, NO MÉRITO, DAR PROVIMENTO AO APELO E AO REEXAME, PARA REFORMAR A SENTENÇA OBJURGADA, PARA RATIFICAR A TUTELA ANTECIPADA CONSTANTE DO EVENTO 12 ? ORIGEM, BEM COMO ACOLHER INTEGRALMENTE OS PEDIDOS FORMULADOS NA INICIAL, CONSTANTES DOS ITENS 1.1 E 2 A 10 (FLS. 40/42 ? INIC1 ? EVENTO 01 ? ORIGEM), PARA QUE O MUNICÍPIO DE PALMAS ADOTE, NO PRAZO DE 30 (TRINTA) DIAS, AS PROVIDÊNCIAS NECESSÁRIAS À INTEGRAL ADOÇÃO DAS MEDIDAS, SEM PREJUÍZO DA APLICAÇÃO DE EVNETUAIS SANÇÕES PENAIS E ADMINISTRATIVAS NO CASO DE DESCUMPRIMENTO. INCABÍVEL A MAJORAÇÃO DOS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS RECURSAIS, DIANTE DA AUSÊNCIA DE SUA FIXAÇÃO NA ORIGEM E DA ESPECIFICIDADE DA CAUSA.

RELATOR DO ACÓRDÃO: Juiz JOCY GOMES DE ALMEIDA

Votante: Juiz JOCY GOMES DE ALMEIDA

Votante: Desembargador EURÍPEDES LAMOUNIER

Votante: Desembargador ADOLFO AMARO MENDES

CARLOS GALVÃO CASTRO NETO

Secretário