EMENTA: AGRAVO EM EXECUÇÃO PENAL. REMIÇÃO FICTA EM RAZÃO DA COVID-19. INEXISTÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL.
1. A falta de previsão legal expressa impede a concessão de remição ficta decorrente do impedimento causado pela pandemia do COVID-19.
2. Ademais, conforme precedente do STJ “os meses em que foi impossibilitado o exercício de trabalho comunitário em razão da pandemia de covid-19 não devem ser computados como pena cumprida, tendo em vista a ausência de previsão legal”.
3. Recurso não provido.
Preenchidos os pressupostos de admissibilidade recursal, o recurso deve ser conhecido.
O caso dos autos versa sobre a possibilidade de remição ficta, tendo em vista o afastamento dos detentos das atividades em decorrência da pandemia pelo COVID-19.
Pois bem.
A remição é um benefício de execução penal garantido ao preso em regime fechado e semiaberto e prevê o resgate de um dia de pena a cada três dias trabalhados. Está disposto no artigo 126, da LEP, in verbis :
Art. 126. O condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semi-aberto poderá remir, pelo trabalho, parte do tempo de execução da pena.
A remição ficta, por sua vez, seria a possibilidade de se ofertar esse resgate aos presos que não realizaram o trabalho, pois estão impossibilitados de prosseguir nas tarefas em razão de ter sofrido acidente do trabalho.
Cumpre destacar que os casos em que é possível a remição ficta estão expressamente consignados no dispositivo legal supracitado que, inclusive, não possui interpretação extensiva, tal como já decidiu o STJ:
“AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EM HABEAS CORPUS. EXECUÇÃO PENAL. REMIÇÃO FICTA. ADMISSIBILIDADE SOMENTE NAS HIPÓTESES PREVISTAS NO ART. 126 DA LEP. IMPOSSIBILIDADE NO CASO CONCRETO. AUSÊNCIA DE PREVISÃO LEGAL. PRECEDENTES DESTA CORTE. 1. Segundo a jurisprudência desta Corte Superior de Justiça, a remição ficta somente é admitida nas hipóteses legalmente previstas no art. 126, caput, da LEP, que elenca para tal finalidade apenas o trabalho e estudo. Não pode a suposta omissão Estatal ser utilizada como causa a ensejar a concessão ficta de um benefício que depende de um real envolvimento da pessoa do apenado em seu progresso educativo e ressocializador. 2. Com efeito, da mesma forma que os estudos, prioriza-se as horas efetivas de trabalho. Só assim é possível analisar o real comportamento do apenado e sua intenção de ressocialização. 3. A Defesa pretende, em síntese, que sejam cassadas as decisões das instâncias ordinárias, que indeferiram o pleito do paciente de homologação da remição ficta, pelo tempo em que teria ficado impedido de trabalhar em virtude da pandemia [...] Não assiste razão à impetrante, uma vez que é firme a jurisprudência deste Superior Tribunal de Justiça no sentido de que, na ausência de expressa previsão legal - a exemplo da regra existente relativa aos reeducandos que venham a sofrer acidente laboral, do art. 126, § 4º, da LEP - não está autorizada a remição ficta da pena do preso que deixou de trabalhar, somente se podendo considerar, para fins de remição, o tempo de trabalho ou de estudo efetivamente cumprido pelo sentenciado (HC 651.897, Relator Ministro FELIX FISCHER, data da publicação: 4/5/2021). 4. Agravo regimental não,provido. (STJ - AgRg no RHC: 146760 MA 2021/0133605-6, Relator: Ministro REYNALDO SOARES DA FONSECA, Data de Julgamento: 08/06/2021, T5 - QUINTA TURMA, Data de Publicação: DJe 14/06/2021)
Apesar de ser um assunto recente, tendo em vista a ocorrência da pandemia pelo COVID-19, o tema já conta com jurisprudência nos Tribunais pátrios. A propósito trago julgado do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo:
“Agravo em Execução Penal. Indeferimento de trabalho externo. Suspensão em razão da pandemia de Covid-19. Impossibilidade de reconhecimento da remição ficta. Jurisprudência do C. STJ. Agravo improvido. (TJSP; Agravo de Execução Penal 0011844-49.2021.8.26.0506; Relator (a): Damião Cogan; Órgão Julgador: 5ª Câmara de Direito Criminal; Foro de Ribeirão Preto - 1ª Vara do Júri e das Execuções Criminais; Data do Julgamento: 26/07/2021; Data de Registro: 26/07/2021)
Ora, a situação de pandemia, reconhecida mundialmente desde 20 de março de 2020, não se equipara, em nenhum aspecto, à ideia de acidente, prevista no artigo 126, § 4º da Lei nº 7.210/845 , o que afasta a pretensa aplicação analógica.
Finalmente, cabe registrar posicionamento do Ministro João Otávio de Noronha por ocasião do julgamento do HC n.º 682.632/MG, do qual extraio os seguintes fragmentos:
“(…) A decisão do Tribunal de origem está de acordo com o entendimento do STJ de que os meses em que foi impossibilitado o exercício de trabalho comunitário em razão da pandemia de covid-19 não devem ser computados como pena cumprida, tendo em vista a ausência de previsão legal. O serviço comunitário foi suspenso por força maior e para não expor o apenado a maiores riscos em razão da pandemia. Adota-se o mesmo entendimento quanto à impossibilidade de remição ficta da pena pelos dias em que o apenado não trabalhou nem estudou por razões alheias a sua vontade, visto que é necessário o envolvimento do reeducando no processo educativo e ressocializador (AgRg no HC n. 434.636/MG, Ministro Nefi Cordeiro, Sexta Turma, DJe de 6/6/2018). Ora, a prestação de serviços à comunidade é também um mecanismo de ressocialização e de contraprestação do apenado, sendo necessário o seu efetivo cumprimento. Vale mencionar que a Recomendação CNJ n. 62/2020 versa sobre a possibilidade de suspensão do cumprimento das penas alternativas (art. 5º, V), mas nada menciona sobre cumprimento ficto das reprimendas. (negritos inseridos).
Ante o exposto, voto no sentido de NEGAR PROVIMENTO ao presente agravo e manter a decisão exarada pelo juízo de origem.