Registre-se, inicialmente, que as Medidas Cautelares Diversas da Prisão, previstas no art. 319 do Código de Processo Penal, aplicam-se aos presos provisórios, de modo a corroborar a excepcionalidade da Segregação Cautelar. Assim, considerando-se que o Agravante se encontra em cumprimento definitivo de pena, com o trânsito em julgado da condenação, afasta-se a possibilidade de substituição da Prisão pelas medidas previstas no art. 319 do CPP.
Por outro lado, no curso da Execução Penal, a Prisão Domiciliar é, em regra, benefício concedido aos casos que se adequam às circunstâncias especiais previstas no art. 117 da Lei de Execução Penal.
No entanto, é possível a concessão da Prisão Domiciliar em situações excepcionais, tais como nos casos em que o estado de saúde do reeducando, aliado às condições precárias do estabelecimento prisional, demonstram a impossibilidade de manutenção da segregação, ou, ainda, nos casos de inexistência de estabelecimento prisional adequado, que culminaria no cumprimento de pena em regime mais gravoso e, por consequência, caracterizaria excesso na execução penal.
Trata-se de medida humanitária e excepcional, que impõe a extensão da norma do art. 117 da LEP nas hipóteses em que houver evidente conflito entre direitos e garantias fundamentais, devendo o intérprete na norma infraconstitucional observar aos Princípios da Dignidade da Pessoa Humana e da Individualização das Penas (Precedentes: STJ, HC 493.374/RS, Relator: Ministro Rogério Schietti Cruz, 6ª Turma, julgado em: 14/05/2019).
Nesse sentido, a situação de "emergência em saúde pública" reconhecida em âmbito nacional e estadual, em razão da pandemia causada pela Covid-19, configura situação excepcional apta a autorizar a Prisão Domiciliar em hipóteses diversas daquelas taxativamente previstas.
A partir de tal premissa, tendo em vista a necessidade de estabelecimento de regras e procedimentos para prevenção à contaminação pela Covid-19, considerando, ainda, que a manutenção da saúda das pessoas privadas de liberdade é essencial à garantia da saúde coletiva, o Conselho Nacional de Justiça publicou a Recomendação nº 62/2020, sugerindo a adoção de medidas preventivas à propagação da infecção pelo novo Coronavírus no âmbito dos estabelecimentos do sistema prisional e socioeducativo.
Especificamente em relação à Execução Penal, dispõe o art. 5º da Recomendação nº 62/2020 do CNJ, medidas com vistas à redução dos riscos epidemiológicos em observância ao contexto local de disseminação do vírus, tais como a concessão de saída antecipada dos regimes fechado e semiaberto, nos termos das diretrizes fixadas pela Súmula Vinculante nº 56 do Supremo Tribunal Federal, sobretudo em relação aos condenados que integrem o grupo de risco da Covid-19.
Assim, apesar de reconhecer que o art. 117 da Lei de Execução Penal dispõe de forma taxativa sobre as hipóteses de cumprimento da pena privativa de liberdade em Prisão Domiciliar, as recomendações dispostas na Recomendação nº 62/2020 do CNJ possibilitam a concessão do benefício.
Isso porque, o Supremo Tribunal Federal, no Recurso Extraordinário nº 641.320/RS, reconhecida a Repercussão Geral, no mesmo sentido, entendeu que a falta de estabelecimento prisional adequado não autoriza a manutenção do Reeducando em regime prisional mais gravoso, sob pena de configurar constrangimento ilegal.
No julgamento do Recurso Extraordinário nº 641.320/RS, determinaram os Ministros que, havendo a viabilidade, ao invés do imediato deferimento da Prisão Domiciliar, devem ser observadas alternativas. Ao final, concluíram os Ministros que "até que sejam estruturadas as medidas alternativas propostas, poderá ser deferida a prisão domiciliar ao sentenciado".
Ressalta-se, ainda, que o mencionado Recurso Extraordinário ensejou aprovação da Súmula Vinculante nº 56, que consolidou o entendimento pela impossibilidade de manutenção do Reeducando em regime mais gravoso.
Não se trata, portanto, de alteração, por meio de ato administrativo expedido pelo Conselho Nacional de Justiça, de requisito previsto em Lei Federal para a concessão da Prisão Domiciliar.
Por outro lado, traduz a tentativa em uniformizar o tratamento aos Reeducandos inseridos no sistema prisional, em observância ao entendimento da Súmula Vinculante nº 56.
Isso porque, em virtude de circunstância excepcional e alheia às condições pessoais e comportamentos dos condenados (pandemia do novo Coronavírus), o isolamento dos estabelecimentos prisionais ensejou a suspensão de benefícios das Saídas Temporárias e do Trabalho Externo e, por conseguinte, o acautelamento integral dos Reeducandos em regime Semiaberto, razão pela qual a concessão da Prisão Domiciliar, nesses casos, é medida de rigor para impedir o excesso na execução.
A propósito, o Superior Tribunal de Justiça, em 02.06.2020, no julgamento do Habeas Corpus Coletivo nº 575.495/MG, entendeu pela necessidade de concessão da Prisão Domiciliar, como medida excepcional, nos termos da Recomendação nº 62 do CNJ, de forma a evitar excesso na execução, tendo em vista a restrição de benefícios executórios, como medida de prevenção à propagação do Covid-19, aliada à ausência de adoção medidas alternativas.
No caso, contudo, verifica-se que, ao indeferir o pedido de Prisão Domiciliar, em razão da situação excepcional causada pela Covid-19, o juízo de origem destacou a retomada gradual das atividades cotidianas da sociedade, com a adoção de medidas sanitárias adequadas (seq. 542.1, SEEU).
Ademais, pontua-se que, a despeito de o Agravante ser maior de 60 anos, integrando o grupo de risco da Covid-19, não há comprovação de que este apresente problemas de saúde ou quadro vulnerável, de modo a justificar o deferimento da Prisão Domiciliar, com fundamento na Recomendação nº 62 do CNJ.
Em consulta realizada, no dia 23 de maio de 2022, ao site do da Secretaria de Saúde do município de Araguaína, este registrou apenas um caso confirmado de COVID19, sendo que não havia nenhum leito hospitalar ocupado por pessoa infectada pelo coronavírus, bem como a primeira dose já foi aplicada em 134.528 pessoas.
A esse respeito, como bem pontuou o ilustre Ministro Rogério Schietti Cruz, na decisão monocrática no HC 567.408/RJ, do colendo Superior Tribunal de Justiça,
A crise do novo coronavírus deve ser sempre levada em conta na análise de pleitos de libertação de presos, mas, ineludivelmente, não é um passe livre para a liberação de todos, pois ainda persiste o direito da coletividade em ver preservada a paz social, a qual não se desvincula da ideia de que o sistema de justiça penal há de ser efetivo, de sorte a não desproteger a coletividade contra os ataques mais graves aos bens juridicamente tutelados na norma penal.
Outrossim, não nos autos nenhum relato de recentes casos de contaminação pelo Covid-19 na Unidade Prisional local, o que demonstra que a situação está sendo controlada mediante ações profiláticas necessárias para a diminuição dos riscos de contágio, sem notícias de agravamento do estado de saúde dos detentos ali reclusos, não se olvidando que, havendo necessidade de atendimento médico, a providência cabe ao estabelecimento prisional em que se encontra custodiado.
Ademais, não há prova robustas nos autos de que o Agravante possua atualmente qualquer problema de saúde que o enquadre no grupo de risco da doença, sendo de rigor, pois, que retome o regular cumprimento de sua pena.
Ex positis, voto no sentido de CONHECER o Agravo em Execução Penal, contudo, no mérito, NEGO-LHE PROVIMENTO, para manter inalterada a decisão que indeferiu o pedido de Prisão Domiciliar.